segunda-feira, 20 de maio de 2013

Um novo retrato do Brasil



Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa apresenta nesta semana o novo modelo de classificação socioeconômica para fins relacionados ao estudo do consumo no País

Por Jonas Furtado jfurtado@grupomm.com.br



Na terça-feira 14, os líderes dos maiores institutos brasileiros de pesquisa se reunirão para o encontro bianual de dirigentes do setor. A Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep) aproveitará o evento para apresentar oficialmente o Novo Critério de Classificação Econômica Brasil, previsto para ser adotado a partir de 1º de janeiro de 2014. Dentre as principais diferenças para o critério utilizado atualmente, estão a substituição da renda declarada por variáveis indicadoras de renda permanente, a expansão da abrangência geográfica e a inclusão da composição familiar, do porte dos municípios e da região onde estão localizados como parâmetros fundamentais para a segmentação dos padrões de consumo dos brasileiros.

O Critério Brasil é uma evolução do indicador criado pela Associação Brasileira de Anunciantes (ABA), no final da década de 1960, para definir uma segmentação mais apropriada da população em classes econômicas e a avaliação do poder de compra de grupos homogêneos.

Com o aumento da importância do consumo (que em 2012 respondeu por 63% das riquezas geradas no País) na composição da economia brasileira na última década, a atualização do critério tornou-se uma demanda urgente de agências, anunciantes e veículos. “É necessária uma segmentação mais adequada do mercado para que as empresas saibam exatamente onde concentrar investimentos. Hoje, mais da metade da população do Brasil está inserida dentro da classe C. É muita gente para se direcionar uma estratégia e o aprimoramento do critério permitirá segmentar essas pessoas”, diz Suzana Pamplona, diretora de insights estratégicos da Johnson & Johnson.

A executiva enaltece a abrangência do novo critério, que leva em conta dados dos 62 mil domicílios cobertos pela Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE em todo o País. O indicador atual cobre 11 mil domicílios de nove regiões metropolitanas (Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Distrito Federal, Salvador, Recife e Fortaleza), por utilizar a amostragem do levantamento socioeconômico do Ibope. “Boa parte do crescimento do Brasil não vem dos grandes centros. A introdução de cidades pequenas e médias dará melhor visibilidade do que acontece no País”, avalia Suzana.

A maior assertividade propiciada pelo novo critério também é celebrada pelo diretor de mídia para São Paulo da DPZ, Boaventura Júnior. “As empresas estão vendendo mais e querem saber para quem, assim como querem conhecer o potencial de crescimento do mercado em que estão inseridos, para lançar produtos específicos” analisa. “Haverá uma modificação na tabela de mídia de alguns veículos, especialmente os mais segmentados, que conhecerão melhor o poder de compra de seu público”.

Origem do novo Modelo

A Abep estudava a adoção de um novo modelo para o Critério Brasil quando, em abril de 2012, os caminhos da entidade se cruzaram com o dos professores Wagner Kamakura, da Escola de Negócios da Universidade de Duke (EUA), e José Afonso Mazzon, da Faculdade de Economia e Administração da USP. Críticos dos métodos em vigor, há dois anos eles desenvolviam um modelo a ser aplicado para uma segmentação socioeconômica mais realista em relação ao potencial de consumo da população brasileira. O projeto resultou em um artigo encaminhado para o Marketing Science Institute, que pode ser premiado na conferência anual do instituto europeu, a ser realizada na primeira semana de junho, na Turquia. O trabalho já está entre os três finalistas.

O modelo proposto por Kamakura e Mazzon usa 35 variáveis indicadoras de renda permanente (como educação, condições de moradia, acesso a serviços públicos, posse de bens duráveis e ativos financeiros e não financeiros) para determinar o potencial de consumo dos domicílios em relação a 20 categorias de produtos e serviços (dentre as quais, alimentação no domicílio e fora de casa, artigos de limpeza, vestuário e saúde e medicamentos). Uma das principais vantagens é a possibilidade de classificação mesmo que apenas parte dessas variáveis seja determinada. “O conceito de renda permanente é o mais adequado para o estudo do consumo, porque considera não apenas a renda corrente dos domicílios. Os gastos envolvem o acúmulo de bens e ativos financeiros e a expectativa das condições de vida para o futuro”, explica Luis Pilli, diretor-geral da Abep, que conduz o processo de implementação do Novo Critério Brasil. Isso possibilita estimar onde as pessoas alocarão seus recursos em caso de aumento de renda.

Luis Pilli e José Mazzon: Maior abrangência geográfica é um dos diferenciais do novo modelo.

“É um critério mais adequado metodologicamente e gerencialmente mais eficiente para a segmentação de mercado. As respostas propiciam maior precisão, uma vez que permitem a caracterização do consumo não só por categorias mas também em termos demográficos, de exposição à mídia, de estilo de vida e valores, propiciando o que o mercado chama de segmentação psicográfica, que leva em conta atitudes, interesses e opiniões”, afirma Mazzon. “Assim como o poder de compra não é igual nas diferentes regiões do Brasil para um mesmo tipo de família, não dá para equiparar o consumo de indivíduos com a mesma renda mas que vivem em municípios com porte distintos ou em domicílios cuja estrutura familiar seja díspar. Os padrões serão muito diferentes”.

O modelo foi desenvolvido para possibilitar tanto a comparação com estudos mais antigos feitos no Brasil (desde que contemplem a estrutura familiar, a região e o porte de município dos entrevistados, além de um mínimo de 15 variáveis previstas no novo critério) feitos no Brasil, quanto com padrões de consumo verificados em outros países, construindo, assim, uma base internacional de dados. “Hoje as multinacionais não conseguem comparar o desempenho de seus produtos em diferentes mercados. Por esse modelo, seria preciso incluir mais uma variável fundamental, para distribuir pesos diferentes para fatores mais menos importantes dependendo dos países envolvidos. É ainda um sonho, mas perfeitamente factível”, assegura Mazzon.

Denominação

O novo modelo divide a população brasileira em sete estratos socioeconômicos. As denominações definitivas ainda não foram definidas – por enquanto, foram ordenadas por números de 1 a 7, sendo 1 a mais alta e 7 a mais baixa. Existe tanto a possibilidade de que continuem desta forma quanto voltem a ser classificadas por letras, como acontece no modelo atual. A Abep estimulará o debate e ouvirá a opinião da indústria da comunicação a respeito do tema a partir do evento desta terça-feira 14.

                                 COMPARAÇÃO ENTRE OS MODELOS*
Novo Critério Brasil
(estimativa)
Critério Brasil
atual
C**
Brasil
RMs***
RMs***
C**
1
2.8%
4.6%
4.5%
A
2
3.6%
5.9%
9.1%
B1
3
15.1%
18.5%
19.3%
B2
4
20.6%
23.9%
25.6%
C1
5
20.6%
23.1%
23.2%
C2
6
22.8%
18.4%
17.1%
D
7
14.5%
5.6%
1.1%
E
100%
100%
100%
                          (*)A comparação é feita em cima de dados da POF relativos ao ano de 2009
                          (**)Classe
                          (***)Regiões Metropolitanas cobertas pelo levantamento socioeconômico do Ibope.

Discursos para um e outro lado



Por Alberto Carlos Almeida


Tornou-se lugar comum afirmar que a clássica divisão entre esquerda e direita deixou de existir. Dependendo do contexto, defender a visão contrária pode ser sinal de desatualização. Assim, apenas pessoas ultrapassadas e presas à terminologia dos anos 1960, talvez 1970, ainda dividiriam o mundo entre esquerda e direita. O que ocorreu nos anos 1980 em muito contribuiu para a eventual dissipação dessa diferença: partidos considerados de esquerda, como o Partido Socialista na França sob a liderança de François Mitterrand, e o Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), sob a batuta de Felipe González, adotaram políticas econômicas antes consideradas monopólio de partidos da direita.
O contexto brasileiro traz alguns elementos favoráveis para o ponto de vista que anula as diferenças entre os dois lados do espectro político: o principal líder do terceiro maior partido em número de deputados, Gilberto Kassab, afirmou recentemente que seu partido não seria nem de direita, nem de esquerda, nem de centro. Guilherme Afif Domingos, prócer do PSD, acaba de acumular dois cargos contraditórios para quem utiliza a classificação supostamente "démodé": é vice-governador em um governo de centro-direita e ministro de um governo de centro-esquerda.


Aliás, no Brasil, ninguém é de direita. Paulo Maluf já afirmou em diversas oportunidades que é um político de centro-esquerda. A palavra "direita" tem conotação negativa não apenas no Brasil, mas também na Europa. Naquele continente, livros cujo tema é a política e têm a palavra "direita" em seus títulos tratam de partidos que defendem políticas extremistas, para não dizer protofascistas. Jean Marie Le Pen é classificado como sendo de direita. Não é o caso, por exemplo, do Partido Popular da Espanha e da Democracia Cristã na Alemanha. São considerados partidos conservadores. Nos Estados Unidos, o Partido Democrata é considerado liberal e o Partido Republicano é o representante do eleitorado conservador. Entenda-se por isso que o primeiro é a esquerda de lá e este último é a direita.
Evitemos a falácia semântica que com frequência nos impede de caminhar rumo a definições úteis, para entender o que ocorre ao nosso redor. É fato que a disputa política gravita, na grande maioria dos países, entre dois partidos importantes: um lado pode ser nomeado de esquerda, progressista ou mesmo liberal, como é o caso americano, e o outro lado pode ser batizado de direita ou conservador. A dificuldade na utilização da palavra "direita" tem a ver tão somente com o caráter pejorativo que denota para a maioria das pessoas. Esqueçamos por ora esse aspecto e a utilizemos somente em função de sua utilidade analítica.
Sim, analiticamente é possível classificar os partidos que se alternam no poder entre esquerda e direita, progressista e conservador (de novo, esqueçamos por ora julgamentos de valor que cada palavra carrega). No Reino Unido, o Partido Trabalhista é de esquerda e o Partido Conservador é de direita. O eleitorado de cada um deles tem a ver com o que defendem. Os trabalhistas britânicos têm relativamente mais votos junto àqueles que têm uma renda menor do que a renda média nacional. O oposto se aplica ao eleitorado do Partido Conservador.
Na Espanha, o PSOE é sistematicamente mais votado na Andaluzia, a região mais pobre de lá. No Brasil, isso ocorre com o PT no Nordeste. Ou seja, do ponto de vista eleitoral, a Andaluzia é o Nordeste da Espanha, ou vice-versa. Os mais pobres votam, em geral, nos partidos que levam a cabo políticas de redistribuição de renda. Eis aqui a principal diferença entre esquerda e direita quando se trata da adoção de políticas públicas, sejam econômicas ou sociais.
Os partidos de esquerda dão prioridade à redistribuição de renda em favor dos mais pobres quando se trata de escolher entre isso e políticas que resultem em mais eficiência econômica. Os partidos conservadores, ou de direita, fazem o oposto: dão prioridade a políticas que resultem em mais eficiência econômica. A alternância no poder ocorre quando, depois de um longo período de redução de desigualdade, quando a eficiência é colocada em segundo plano, a maioria da sociedade passa a demandar mais eficiência. Esse fenômeno fica claro para o eleitorado toda vez que o PIB deixa de crescer ou mesmo quando um país entra em recessão como resultado dessa falta de prioridade em políticas que resultem em eficiência econômica. O oposto também acontece. Longos períodos de governos de direita podem resultar no aumento da desigualdade, situação na qual o partido de esquerda é convocado pelo eleitorado para que políticas redistributivas voltem a ter prioridade.
Os governos Lula e Dilma foram e são inequivocamente de esquerda. A principal evidência que sustenta esta afirmação é a redução da desigualdade de renda no período. Durante os dois governos Fernando Henrique, houve, sim, redução da desigualdade quando mensurada pelo índice de Gini. Foi, porém, durante os governos do PT que essa redução se acentuou. A diferença entre os governos do PSDB e do PT tem a ver com prioridade. Para o PSDB, a prioridade foi a adoção de políticas que resultaram em mais eficiência econômica, sinônimo de desregulamentação da economia. A desigualdade foi combatida por meio do Bolsa Escola e outras políticas sociais, como a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas), mas não foi essa a prioridade. No período de governos petistas, a eficiência econômica foi buscada por meio da reforma da previdência, da aprovação do fundo de pensão dos funcionários públicos e outras políticas dessa natureza. A prioridade foi, porém, o combate à desigualdade feito com políticas como o aumento real do salário mínimo e o Bolsa Família.
Essa diferença entre os dois partidos é reconhecida pelo eleitorado. Em 2006 e 2010, Lula e Dilma tiveram votação avassaladora no Nordeste, a região mais pobre do país e a que mais se beneficiou das políticas de redução da desigualdade. Enquanto isso, São Paulo, o Estado mais rico, vem sistematicamente dando vitória aos candidatos a presidente do PSDB. Igualmente interessante é o mapa eleitoral de Minas Gerais: a região mais próxima do Nordeste dá vitória ao candidato do PT, e a região mais próxima de São Paulo escolhe os candidatos a presidente do PSDB.
Além disso, quando se solicita ao eleitor, por meio de pesquisas de opinião, que compare o PT com ele mesmo quanto aos atributos "cuidar dos pobres" e "governar com eficiência", o primeiro alcança percentual mais elevado. Na avaliação do PSDB, o resultado é o inverso: governar com eficiência vem na frente de cuidar dos pobres. Ou seja, as imagens relativas de cada partido estão de acordo com as políticas públicas que adotam. O mesmo ocorre com seus respectivos eleitorados.
A eleição de 2014 terá no centro do debate as políticas públicas que redistribuem renda, assim como as políticas que resultam em mais eficiência econômica. Aécio Neves tem criticado o PT sempre batendo na tecla de que os governos Lula e Dilma não foram capazes de construir e reformar estradas, nem de desenvolver a estrutura aeroportuária de que o país necessita. Note-se que esta é a agenda da eficiência, não é a da redistribuição de renda.
O PT, em sua recente propaganda política na TV e no rádio, enfatizou que os governos Lula e Dilma enfrentaram a pobreza e a miséria. Uma das estrelas do programa foi o eleitorado pobre; outra, o negro. Não foi por acaso. A população negra, homens e mulheres, foi uma das grandes beneficiárias das políticas de redistribuição de renda.
Qualquer candidato que, como Eduardo Campos, almeje ser a terceira via, terá que lidar com os dois temas, o da redistribuição de renda e o da eficiência econômica. Mais do que isso, ainda que leve o nome de terceira via, um terceiro candidato precisa ter lado, não apenas o lado da oposição (porque candidato governista só existe um), mas também o lado que escolhe uma prioridade, o lado que o coloca à direita ou à esquerda do espectro político. Quanto a isso, não restam muitas opções. Um terceiro candidato que também seja de oposição a um governo de esquerda precisará defender um programa de governo que tenha a eficiência econômica como prioridade. A grande questão é qual a fatia do eleitorado que esse discurso pode conquistar em 2014. Considerando-se as projeções de hoje, parece não ser das maiores.
Alberto Carlos Almeida, sociólogo, é diretor do Instituto Análise e autor de "A Cabeça do Brasileiro". E-mail: alberto.almeida@institutoanalise.comwww.twitter.com/albertocalmeida

Uma causa para chamar de sua

Executivos de marketing e comunicação precisam estar prontos para esta nova demanda.


Por: Kátia Mello

No final do ano passado, a Panasonic lançou a terceira fase da campanha “Repense”. A bela apresentadora Fernanda Lima aparece numa propaganda para a TV para anunciar a primeira fábrica de linha branca ecotecnológica na América Latina, inaugurada em setembro, em Extrema, no Estado de Minas Gerais. No lugar do pinguim, uma arara azul entra pela janela e pousa na geladeira. A campanha “Repense” faz parte de uma meta global da Panasonic até 2018, ano em que se comemora o centenário da empresa japonesa: consolidar a imagem de companhia preocupada com o meio ambiente e produtos de ponta. A Panasonic almeja ser a número um em tecnologia verde.


O resultado da estratégia já foi medido pela empresa. Segundo pesquisa fechada do departamento de marketing, a Panasonic do Brasil voltou a ser apontada pelo consumidor como uma das três principais marcas de eletroeletrônicos. E ainda alcançou um crescimento de dois dígitos em vendas em relação ao ano anterior. “Foi surpreendente. O consumidor captou a mensagem e voltou a falar diretamente conosco”, afirma a diretora de marketing Renata Assis.



Ela conta que, há cerca de um ano, houve um consenso na Panasonic de que a comunicação precisava ser aprimorada e que as Eco Ideias, como eles chamam seus princípios relacionados ao meio ambiente, precisavam receber o reconhecimento de todos. “Embora fizéssemos muitos esforços, o consumidor não enxergava os benefícios de sermos ecossustentáveis”, reconhece a executiva.

A apresentadora Fernanda Lima foi escolhida a dedo não apenas por representar o público feminino jovem, mas por ser uma personalidade que demonstra ter preocupação ambiental. A arara azul do filme publicitário não era real, um cuidado para não ofender as organizações de proteção aos animais. Para elaborar a campanha, a Panasonic foi buscar na ONG Save Brazil um entendimento melhor sobre esse pássaro e sua ameaça de extinção. Deu tão certo que a empresa agora quer apoiar um projeto de apoio à preservação da arara.

O caso da Panasonic é apenas um entre milhares de empresas que estão reestabelecendo a maneira de comunicar a marca. Elas deixaram de se preocupar apenas com os quatros Os (produto, praça, preço e promoção) para se aliar a algum tipo de causa em todos os âmbitos, sejam sociais, ambientais, culturais, esportivos, comportamentais. O movimento não é recente, mas foi nesta década que ganhou força.

Para o especialista no tema e diretor da consultoria Full Jazz Comunidade, João Francisco de Carvalho Santos, as práticas que norteiam a cidadania corporativa têm evoluído de tal maneira e numa velocidade tão rápida que, uma vez absorvidas, transformam as empresas e suas marcas de maneira positiva. João Santos considera que o modelo não é transitório e, possivelmente, seja irreversível, apesar de alguns profissionais do marketing e empresários ainda resistirem a ele. “Os próprios investidores preferem boas práticas de gestão de sustentabilidade, porque a taxa de risco se torna menor neste mundo já tão imprevisível”, diz.

Nova ou velha guarda

Se por um lado o modelo avança, faltam profissionais no mercado que acompanhem este movimento para traduzi-lo melhor dentro das companhias. Santos aponta a falta de conhecimento nesta área e a escassa formação dos profissionais de marketing como um dos grandes problemas para um maior avanço. “Nossa academia precisa incorporar as causas relacionadas às marcas de forma mais prática, colocando isso em sua grade curricular. Infelizmente são poucos os casos ispiradores no Brasil”, lamenta.



Esta preparação envolve aspectos formais e informais, complementa Marco Antonio Machado, professor do CBA Marketing do Ibmec. No campo formal, além dos cursos ligados a temas relativos a sustentabilidade, é preciso que o profissional de marketing tenha bons conhecimentos de psicologia, sociologia, filosofia e história. Para ele, estas são matérias que dão visão abrangente e treinam o raciocínio para ficar alerta acerca de sofismas (falsas verdades e aparências enganosas) e paradigmas (modos fechados ou estreitos de interpretar a realidade e os fatos). “Vejo o marketing como um fenômeno social e não apenas econômico ou ligado a negócios e empresas”, pondera. Machado também aconselha a ter a mente aberta a inovação e, mais do que isso, aceitar a mudança, procurar associar-se a ela, fazendo com que se torne uma aliada.

Hiran Castelo Branco, vice-presidente de operações da ESPM, considera que as empresas precisam de “profissionais dispostos a construir com coragem o amanhã”. Eles podem ser das novas gerações ou da velha guarda. “As novas gerações têm mais chance de obter êxito, por estarem mais conectadas com os valores da economia colaborativa, poder lateral, necessidade de transparência e responsabilidade socioambiental, que são inerentes ao modelo de economia de baixo carbono para o qual temos de caminhar. A velha guarda tende a ser mais relutante, embora n´~ao seja regra geral”, analisa. Mas se, por um lado, a chamada velha guarda pode ser resistente às mudanças, sua experiência é importante no momento de fazer um mix com a equipe mais jovem.



Os mais procurados são os profissionais de administração, marketing e comunicação que vão além da formação profissional, sinaliza Yacoff Sarkovas, CEO da Edelman Significa e um dos mais respeitados consultores nesta área. Pioneiro da chamada “atitude de marca”, relata que o novo protótipo deste profissional é o engajado em ativismos sociais, culturais e ambientais, porque se encaixa nas novas demandas. Quem não está engajado em nenhuma causa e não acompanha os movimentos mundiais precisa se atualizar. E isso pode ser feito com palestras, workshops, cursos de pós-graduação e MBAs em sustentabilidade.



Marcas mais autênticas

Entre os especialistas, existe um consenso de que a Natura é um exemplo clássico de companhia brasileira que já nasceu com atitude de marca e vem se aperfeiçoando neste conceito. A Natura inclusive se nega a dizer que abraça uma causa. Para a empresa, tudo faz parte das crenças e valores da companhia estabelecidos desde seu embrião, há quatro décadas.

“A gente não gosta da palavra causa porque ela limita. Nossa atitude frente aos stakeholders, começando pelos colaboradores, faz parte das manifestações de nossos princípios, de nossa visão de mundo”, comenta Mônica Gregori, diretora de marketing e comunicação da empresa. Para ela, este não é um diferencial competitivo, mas uma forma de se fazer negócio.

Quando se pensa em uma nova linha de produtos na Natura, muitas vezes, profissionais de outras áreas, como antropólogos e sociólogos, são convidados a discutir as novas campanhas. Porém sempre se começa a debater os temas a partir das crenças da empresa. Uma delas é que “a vida é um encadeamento de relações e nada no universo existe por si só; tudo é interdependente”. Dentro dessa perspectiva surgiu, por exemplo, a Ekos, uma linha carro-chefe que nasceu com o propósito de expressar a conexão ente o homem e a natureza. “A Ekos nos ensinou a fazer uma gestão de parceria com as comunidades. Aprendemos juntos e ambas as partes fizeram tudo de uma forma muito madura”, conta Mõnica.

Em 2010 foi criado o Instituto Natura, para atuar nas políticas de sustentabilidade, com profissionais específicos dessa área. O instituto hoje tem 16 projetos, entre eles o Trilhas, de incentivo à leitura nas escolas públicas. A verba para as iniciativas do instituto vem da venda dos produtos Crer para Ver. Hoje o montante total está em R$ 12 milhões.

Para a diretora de marketing da Natura, o que estamos vivendo no Brasil é um processo de transformação das empresas e, consequentemente, de seus profissionais. “Os consumidores estão fazendo com que as marcas sejam mais autênticas, genuínas, e falem das coisas mais relevantes”, revela Mõnica.




Assim, as ações deixaram de ser pontuais, com eventos de marketing social, e hoje o campo de atuação de quem está ligado às causas se tornou mais valorizado. Prova disso é que, no ano passado, o Festival de Cannes premiou cases de cunho social como o Banco Popular de Porto Rico e o Small Business Saturday, da American Express para deixar evidente que esta é a atual tendência.

Aliás foi a própria American Express a primeira a usar, em 1983, o termo Cause Related Marketing (CRM) ou Marketing Relacionado a Causas (MRC), como uma estratégia para estabelecer parcerias entre empresas e entidades civis em que ambas as partes sejam beneficiadas. De acordo com o Guia Prático de Marketing Relacionado a Causas: Diretrizes e Causas (2007), elaborado pelo Instituto de Desenvolvimento do Investimento Social (Idis) e pela Charity Aids Foundation (CAF), na década de 1990, o conceito foi ampliado pela agência norte-americana Cone Inc. como “um poderoso posicionamento utilizado para fortalecer o valor da marca e potencializar a imagem corporativa, com um significativo resultado e impacto na sociedade”. O guia cita como o mais antigo programa de marketing de causa no Brasi o McDia Feliz, do Mc Donald’s, que entre 1988 e 2006 teria arrecadado R$ 63 milhões para entidades que cuidam de crianças com câncer.



Tudo às claras

A adoção de práticas de MRC não pode ser casual, transitória, como uma campanha de Natal. “É preciso haver planejamento para colocar a causa no centro da marca”, alerta João Santos, da Full Jazz Comunidade. Além disso, as empresas e todos os envolvidos, sejam os donos ou dirigentes da área de marketing, precisam ser coerentes na hora de optar por uma causa.



Ele cita como exemplo um empresário que queria construir hospitais para dar assistência às vítimas de acidente vascular cerebral (AVC), por ter perdido uma filha com esta doença. Quando sua empresa levantou um estudo sobre a questão, percebeu que esta não seria a melhor opção de causa para se engajar. Isto porque a construção de novos hospitais em nada beneficiaria as pessoas vitimadas por um AVC.



Um dos principais pontos, e certamente um dos mais difíceis na adoção de uma causa, é a transparência. Ela deve permear todos os níveis da empresa, do comportamento de seus profissionais aos mecanismos de expressão da companhia. Não basta defender princípios éticos se o papel desempenhado pelos líderes ou funcionários não seguir os princípios e as verdades da empresa. Não basta um diretor de marketing dizer que sua empresa valoriza as relações humanas e os comerciais usam estereótipos ou incitam as pessoas a mentir sobre os produtos que oferecem. Se a companhia abraçou uma causa, seus valores devem estar presentes em todos os departamentos e nas suas relações com os stakeholders, dos fornecedores ao consumidores e às comunidades em que atua.

A transparência não é só o que se comunica, mas como se comunica e como isso reflete na legitimidade da empresa. Os especialistas dizem que, caso não haja transparência, a iniciativa de se adotar uma causa pode acabar virando um tiro no pé. Por isso muitas companhias estão fazendo transformações internas antes de dar o próximo passo e assumir esse compromisso.



A operadora de telefonia Claro foi ganhadora em Cannes, no ano passado, do Ouro brasileiro em Press com uma campanha, criada pela Ogilvy, que pedia aos motoristas para não enviar torpedos enquanto dirigem. Agora, segundo a diretora de marketing da Claro, Trícia Cristilli, a empresa quer uma atuação maior nas comunidades carentes e está se preparando para lançar em abril outra campanha, envolvendo música e jovens.

Porém, justamente pelo fator transparência, o projeto só será efetivado depois que a operadora resolver uma questão anterior: oferecer um melhor serviço telefônico às comunidades onde irá atuar. Em poucas palavras, não adianta abraçar uma causa em um lugar onde a marca não é recebida de maneira apropriada. “O desafio é a entrega de um serviço de qualidade e por isso o trabalho é de formiguinha. Não adianta enganar”, declara Trícia.

Sempre conectado

A Coca-Cola, uma das precursoras dessa jornada das causas, sabe muito bem disso. “É primordial que todos os programas e ações que desenvolvemos de sustentabilidade gerem valor social e econômico para as comunidades onde atuamos. Isso está em nosso DNA”, diz Andrea Souza Silva, gerente de comunicação externa e sustentabilidade da Coca-Cola Femsa Brasil.

A empresa se empenha em entender o perfil das pessoas que estão em torno das operações da marca para compreender quais ações atendem melhor às suas necessidades, garante a executiva. Desse modo, fica mais fácil impactá-las positivamente e, assim, fazer com que aceitem a ação. Na Coca-Cola, as questões sociais e de sustentabilidade não estão sob o guarda-chuva do marketing, mas sob a batuta da área de sustentabilidade. “O desafio é encontrar boas oportunidades dentro do segmento de ação da companhia”, diz Andrea.

Entre as campanhas sustentáveis da Coca-Cola está “Cada garrafa tem uma história” que conta como os programas apoiados pela empresa podem transformar vidas. “A campanha foi concebida de forma diferente de tudo o que já fizemos. Sem roteiro pré-definido, convidamos o cineasta Breno Silveira para vivenciar nossas iniciativas. Ele descobriu pessoas incríveis que fazem diferença positiva em suas comunidades”, conta a gerente.

A campanha foi veiculada em toda a América Latina. Entre os protagonistas está o líder do movimento de catadores de lixo Tião Santos, que também faz parte de outros programas da Coca-Cola, como Reciclou Ganhou e Assentos do Estadio Maracanã com Garrafas PET, ambos focados na reciclagem.

Não foi por acaso que a companhia escolheu Santos, presidente da Associação de Catadores do Jardim Gramacho, o Rio de Janeiro. Ele é um cidadão engajado e se tornou estrela internacional depois de protagonizar Lixo Extraordinário, que concorreu ao Oscar de melhor documentário em 2011 e que tem como tema o trabalho do artista plástico Vik Muniz sobre os catadores do maior aterro sanitário do mundo. Estar atento a pessoas como Tião Santos faz parte desta conexão com esse novo mundo.



Desafios do novo approach
Dicas para os profissionais
enfrentarem os novos desafios
·                    Identificar os sentimentos e os valores que são mais importantes e significativos para seu público-alvo, especificamente, e para a sociedade, de forma geral.
·                    Adaptar estratégias, produtos e serviços a esses sentimentos e valores.
·                    Gerar nos colaboradores (marketing interno) a consciência de que valores e sentimentos precisam ser atendidos e que isto constitui fator crítico de sucesso para a organização.

·                    Conciliar o cumprimento dos desafios acima com a manutenção e aumento da lucratividade e da rentabilidade.
·                    Estar sempre preocupado com as mudanças e a evolução da sociedade e do comportamento do consumidor.
·                    Ter sempre em mente que as empresas que primeiro e melhor detectam tais mudanças e sentimentos tem mais probabilidade de sair na frente e se estabelecer como referência diante dos clientes e da sociedade.