Steve Jobs tinha uma maneira muito particular de pensar, trabalhar e de fazer suas apresentações. Ele os fazia sempre com base em três pontos. De três em três pontos, ele ia marcando seu pensamento. Até fizeram uma teoria de apresentação de idéias com base nisso – a apresentação de três pontos. Então, de certa forma, para homenageá-lo, vou fazer este artigo em três pontos. Acredito que Steve Jobs deixou três legados para a gente, e esses três legados tem tudo a ver com propaganda.
Começando por surpreendimento. Surpreender é a palavra que regeu os 56 anos de vida de Steve Jobs. É talvez aí que resida boa parte do seu sucesso. Em uma entrevista à Business Week de 1998, ele disse uma frase crucial para quem faz do marketing e da comunicação seu ofício. “Muitas vezes, as pessoas não sabem o que elas querem até que você mostre a elas”, disse em uma crítica aberta à ditadura do focus group. Em outras palavras, estava defendendo a tese de que não é ouvindo o que o consumidor gosta que você vai criar novos produtos, novos serviços ou novas idéias. Prepotência? Desrespeito ao consumidor? Nada disso, muito ao contrário. Steve Jobs certamente está entre os executivos, se não for o líder deles, que mais ouviu e respeitou o consumidor na história moderna da indústria, estejamos nós discutindo produto ou serviço. Porém, ele não os obedecia, ele os surpreendia. Tenho a impressão de que ele acordava todos os dias com a vontade de despertar vontades que não existiam, de criar necessidades até então desconhecidas.
O primeiro legado de Steve Jobs é a forma com que ele criava novos quereres na vida do consumidor. Com ele, precisamos repensar a ditadura das pesquisas, para que, com elas, tenhamos mais insights, mais possibilidades de encontrar caminhos para ir além do que o consumidor aprova. Pesquisa precisa trazer mais aprendizado do que aprovação ou autorização. Precisamos surpreender os desejos do consumidor. Como? Arriscando.
Mas para surpreender, tem que ter coragem. Coragem de assumir riscos. Este é o outro legado vivido intensamente pelo fundador da Apple. Assumir o risco é assumir a possibilidade do insucesso. Quantifique os produtos criados por Jobs da década de 1970 para cá e verá que essa matemática trará mais fracassos do que sucessos. E qual o problema disso? Se o erro for usado como adubo, ele traz em si a possibilidade de um acerto futuro. Diz a sabedoria popular que, ao ser pressionado por tantos fracassos antes de criar a lâmpada, Thomas Edison teria dito “Por que desistir agora, que já sabemos muitos modos de como não fazer uma lâmpada?” Jobs era isso, sempre buscava a lâmpada.
E com isso ensina a nós publicitários, clientes e profissionais de marketing, que precisamos aprender a errar mais para acertar mais. Precisamos romper padrões em busca de novos caminhos, em busca de pensar o diferente para padrões já estabelecidos. E isso nos leva ao terceiro legado de Jobs: usabilidade.
Sou um aficionado por tecnologia, talvez herança dos meus tempos de engenheiro, um interesse que nasceu quando a tecnologia ainda era cinza, verde e preta, pelo menos para mim. Eu adorava entrar nos sistemas operacionais para criar comandos que fizessem as máquinas fazer o que eu queria. Mas, eu usava a computação como um nerd. A humanidade não é assim. E aí temos outra grande revelação sobre Steve Jobs.
Ele não era um inventor de tecnologia, mas sim, foi um revolucionário na forma de fazer a tecnologia ser usada. A revolução de Jobs não está em criação de um novo hardware (ele até fez isso, mas não considero este o seu maior legado). Ele não inventou o mouse, não inventou o touchpad, mas revolucionou a maneira como a gente passou a usar o mouse e o touchpad. Jobs era o gênio da usabilidade. Ele foi um mestre em tornar os produtos mais úteis, mais gostosos de serem manuseados e utilizados na rotina dos consumidores.
E conseguia isso buscando simplicidade e beleza, que são dois grandes pilares do design. O design está a favor da usabilidade e a usabilidade a favor do consumidor.
Pois é. Ficamos com as lições de coragem, surpreendimento e usabilidade desse grande gênio contemporâneo. Ficamos com todos os seus acertos de iPads, iPods, iPhones. Ficamos até com um novo significado para a letra i. Coloque o i na frente de um substantivo e seu significado é imediatamente modificado. Não consta nos dicionários, ainda, mas todo mundo entende. Essencialmente, ficamos agora com um mundo sem Steve Jobs; mas graças a ele, valorizando cada vez mais o beta que o mundo pode ser. I-obrigado.
Sergio Valente, presidente da DM9DDB
Publicado originalmente no jornal Meio&Mensagem Edição 1480 de 10/09/2011
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