Por Alberto
Carlos Almeida
Caso Eduardo Campos venha a ser candidato a
presidente em 2014, haverá muitas semelhanças entre sua candidatura e a de Ciro
Gomes em 1998. A primeira delas é que tanto 1998 quanto 2014 são disputas com
reeleição. Fernando Henrique completava o seu primeiro mandato com a
popularidade elevada em função do aumento de consumo da população mais pobre.
Ele tinha, pelas pesquisas públicas da época, em torno de 47% na soma de ótimo
e bom. O Plano Real havia sido o principal cabo eleitoral de FHC em 1994 e
assegurava um caminho sem sustos para uma segunda vitória.
Em 2014, Dilma disputará a reeleição. É impossível
prever o cenário econômico do segundo semestre do próximo ano. O fato é que o
consumo das famílias vem aumentando acima do crescimento do PIB e o desemprego
vem se mantendo em patamares muito baixos, os menores níveis da história deste
índice. Isso assegura a Dilma uma popularidade muito elevada: a soma de ótimo e
bom está no patamar de 65%. Se Fernando Henrique foi reeleito com 47% de ótimo
e bom e Lula com 56%, o que não dizer, então, do favoritismo de Dilma, caso ela
venha a manter o atual nível de aprovação? Ocorrendo isto, a candidatura de
Campos enfrentará em 2014 a mesma dificuldade que teve Ciro em 1998: um
ocupante de cargo muito popular que disputa a reeleição. Por isso Ciro perdeu,
também por isso os candidatos de oposição em 2014 tendem a perder.
A segunda semelhança diz respeito à região do
candidato: Ciro Gomes e Eduardo Campos são políticos que fizeram toda sua
carreira no Nordeste. Ciro foi eleito governador em 1990 e exerceu seu mandato
até setembro de 1994, quando deixou o cargo para assumir o posto de ministro da
Fazenda de Itamar Franco. Eduardo Campos já foi governador de Pernambuco por
quatro anos e agora está em seu segundo mandato. Caso seja candidato, ele
deixará o cargo no primeiro semestre do ano que vem.
Como ex-governador de um Estado nordestino, Ciro
acabou sendo mais votado no Nordeste do que nas demais regiões do Brasil. O
mesmo tende a acontecer com Eduardo Campos.
É interessante recordar que, na eleição de 1998,
Fernando Henrique venceu em quase todos os Estados. Ele perdeu para Lula no Rio
Grande do Sul e no Rio de Janeiro e perdeu para Ciro no Ceará.
Ciro conquistou pouco mais de 34% dos votos válidos
em seu Estado. Igualmente importante foi a sua votação em vários Estados do
Nordeste: 20,3% em Alagoas; 18,6% no Rio Grande do Norte; 18,5% no Piauí; 16,3%
no Maranhão; 16% na Paraíba; e 11,3% em Sergipe. Nesses Estados, Ciro ficou
acima de sua média nacional, que foi 10,9%. Na Bahia e em Pernambuco, ele ficou
abaixo. Vale mencionar que os três principais estados do Nordeste, que cultivam
uma certa rivalidade entre eles, são, além de Bahia e Pernambuco, o próprio
Ceará de Ciro.
O desempenho de Ciro no Nordeste disputando uma
eleição contra um presidente bem avaliado, tendo Lula como principal
oposicionista a Fernando Henrique, sugere que a eventual candidatura de Campos
terá no Nordeste uma votação acima de sua média nacional, com destaque para o
seu Estado, Pernambuco.
Além disso, Campos corre o risco de ter uma votação
menor do que a média nacional no Ceará e na Bahia. Além da rivalidade regional,
o atual governador da Bahia é do PT e a família Gomes, Cid e Ciro - que, hoje,
lideram politicamente o Ceará - tende a não apoiar Eduardo Campos.
Ciro ficou acima da média no Nordeste e abaixo em
São Paulo, onde conquistou somente 7,4% dos votos. Esse é um destino provável
de uma eventual candidatura de Campos: o Nordeste puxando sua votação para cima
e São Paulo fazendo o inverso.
Outra semelhança entre o Ciro de 1998 e a eventual
candidatura de Eduardo em 2014 é que ambos terão colocado seu nome em uma
disputa nacional pela primeira vez. Isso é de suma importância. O
desconhecimento é uma grande barreira ao favoritismo em uma eleição presidencial.
Collor, quando foi candidato, beneficiado por uma
legislação eleitoral então permissiva, ocupou o tempo de TV pré-eleitoral de
vários partidos para se tornar nacionalmente conhecido. Além disso, ele ocupou
a mídia nacional com o agressivo marketing do "caçador de marajás",
aquele que, em Alagoas, supostamente combatia os privilégios dos funcionários
públicos.
Serra construiu seu recall nacional a partir do
Ministério da Saúde. De janeiro a novembro de 2001, ele foi a autoridade que
mais utilizou a rede nacional de rádio e TV, sempre com a justificativa de
lançar e dinamizar programas de seu ministério.
Os temas de Serra diziam respeito diretamente à
vida de todos os brasileiros: campanhas de vacinação, remédios mais baratos por
meio dos genéricos etc. Foram dez aparições de Serra, contra sete de Fernando
Henrique e quatro de Paulo Renato, o ministro da Educação. Entre agosto e
novembro, Serra ocupou a cadeia nacional por 13,3 minutos, ao passo que
Fernando Henrique a ocupara por 11 minutos. Em dezembro de 2001, Serra foi ao
"Domingo Legal" de Gugu Liberato e ao "Programa do
Ratinho".
Serra se tornou nacionalmente conhecido antes do
ano eleitoral, mas foi derrotado mesmo assim. Em 2009, Lula sabia por
experiência própria das dificuldades envolvidas em entrar numa disputa com um
candidato pouco conhecido. Exatamente por isso o então presidente iniciou um
périplo pelo Brasil com Dilma. Ele desejava associar o nome de Dilma a seu
governo, mas, principalmente, desejava torná-la nacionalmente conhecida.
Ciro não teve essa chance antes de 1998. Aliás,
teve como ministro da Fazenda, no fim do mandato de Itamar. Mas foi um período
muito curto e, por isso, insuficiente para projetá-lo nacionalmente. Não está
claro se Eduardo Campos terá esta oportunidade, caso venha a ser candidato. O
fato é que ele, hoje, não tem mais de 4% nas intenções de voto nacionais. O
principal motivo é que ele não é nacionalmente conhecido. Falta-lhe
"recall".
Ciro foi candidato em 1998, tornou-se nacionalmente
conhecido, sobreviveu politicamente sem mandato até 2002, quando se candidatou
novamente. No fim de junho de 2002, ele chegou a estar tecnicamente empatado
com o líder das pesquisas, Lula, na casa dos 30% de intenção de voto. O que a
trajetória de Ciro ensina é que, para se tornar o favorito em uma eleição, é
preciso primeiro ser candidato, sem chances de ganhar, fazendo uma boa
campanha, para atingir um percentual de pelo menos 10% de votos nacionais. Em
particular se essa primeira eleição for disputada contra um ou uma presidente
muito popular, que disputa a reeleição.
Quando Ciro disputou em 2002, não havia ninguém
concorrendo à reeleição e ele já tinha construído "recall" nacional.
Foi por isso que ele bateu na casa dos 30% de intenção de voto. A sua queda se
deveu a várias declarações que ele deu em público e que foram utilizadas por
seus adversários, mas também por ele não ter sido considerado pelo eleitor nem
de governo nem de oposição. O candidato de governo era, na cabeça do eleitor,
Serra. E o oposicionista era, sem sombra de dúvida, Lula.
Isso indica que o grande obstáculo para as
pretensões de Campos em 2018, caso ele seja candidato em 2014, é o eventual
desempenho eleitoral de Aécio pelo PSDB. Considerando-se o cenário mais
provável de vitória de Dilma, caso Aécio seja o segundo mais votado em 2014 e
se a diferença entre Aécio e Campos for expressiva, a situação do governador de
Pernambuco se complica para 2018. Aécio conta com uma máquina política
formidável, desde que atuante: os governos de Minas Gerais, São Paulo, Paraná,
Goiás e Pará.
Além disso, o histórico das últimas cinco eleições
favorece o PSDB: em todas elas, a disputa ocorreu entre os petistas e os
tucanos. Eduardo Campos precisa fazer um esforço hercúleo para deslocar Aécio e
seu partido do terreno da oposição. A inércia é favorável ao PT e ao PSDB: ela
tende a mantê-los como os principais contendores presidenciais.
Aí está o principal incentivo para Campos ser
candidato: se ele não se candidatar, a eleição de 2014 e, provavelmente a de
2018 também, tenderá a ser uma disputa semelhante a todas as ocorridas após a
redemocratização do Brasil, com exceção da eleição de 1989. A inércia do
cenário político e eleitoral está contra as pretensões de Campos e justamente
por isso ele é o principal interessado em modificar esta situação. Para Eduardo
Campos, ser candidato seria um ato de ousadia, iria contra o tradicional
conservadorismo dos políticos. Porém, é a única decisão que confere a ele
alguma chance de se tornar um candidato a presidente competitivo em 2018.
Alberto Carlos Almeida, sociólogo e
professor universitário, é autor de "A Cabeça do Brasileiro" e
"O Dedo na Ferida: Menos Imposto. Mais Consumo". E-mail: alberto.almeida@institutoanalise.com
www.twitter.com/albertocalmeida
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