Rodnei Riscali
(à dir.): uísque Chivas e crupiê para jogar pôquer com os amigos
São Paulo - As rodadas semanais de pôquer com os amigos na casa do paulista Rodnei Riscali, de 30 anos, não são mais as mesmas. Desde 2011, o encontro informal realizado às terças-feiras em seu apartamento no Morumbi, na zona sul de São Paulo, ganhou um ar de sofisticação.
Um crupiê embaralha e distribui as cartas, e um barman prepara drinques. Um lote de uísque Chivas sempre abastece a reunião, eventualmente até com exemplares envelhecidos em 25 anos, que chegam a custar 1 000 reais a garrafa.
Mas para Riscali tudo isso sai de graça. A mordomia começou quando ele
aceitou se tornar um dos 19 embaixadores da fabricante francesa de bebidas Pernod Ricard no Brasil.
Sua única contrapartida é garantir a presença da marca em seus eventos
sociais com os amigos. Quando Riscali faz aniversário, a empresa se encarrega
de mimar ainda mais seu embaixador. Jogador de golfe, ele já ganhou um taco e
outros apetrechos para o esporte. “Já indiquei outros amigos que se
interessaram em fazer parte do grupo“, diz.
Mimos assim prosperam junto com o mercado de luxo no Brasil. O investimento das empresas
em atividades para se aproximar do público classe A no país mais do que dobrou
nos últimos três anos e chegou a 300 milhões de dólares em 2012, segundo a
consultoria americana Colloquy, especializada no relacionamento entre empresas
e consumidores.
Por trás desses números estão atividades que vão muito além de
mandar cartão de aniversário — como viagens e participação em clubes e eventos
fechados. Esse esforço é uma tentativa de cativar um público disposto a gastar
cada vez mais.
A empresa de pesquisa americana Digital Luxury Group calcula que o
Brasil movimentou 12 bilhões de dólares em produtos de luxo em 2012 — 24% mais
em relação a 2011. “Oferecer experiências relevantes se mostrou uma maneira
eficiente de aprofundar vínculos com o consumidor”, afirma Fernanda Mandryk,
consultora da paulista MCF, especializada no mercado de luxo brasileiro.
Nos casos mais bem-sucedidos, identificar os clientes certos foi tão
importante quanto definir a experiência certa. Para selecionar seus primeiros
embaixadores, em 2010, a Pernod Ricard contratou uma consultoria especializada
em localizar consumidores de alta renda. Em geral, os escolhidos são homens de
25 a 35 anos, com alto poder aquisitivo e hábito de reunir os amigos
frequentemente.
Nos anos seguintes, o grupo cresceu por indicações, até chegar aos
atuais 19 embaixadores. Treze deles estão em São Paulo, quatro em Brasília e
dois em Goiânia — os três principais mercados para a Chivas no Brasil. A
relação é revista de tempos em tempos, já que a parceria pode ser renovada
todos os anos.
Aqueles que conseguem reunir mais
pessoas ao longo de um ano podem ganhar uma viagem para conhecer a destilaria
na Escócia. Os que se acomodam são substituídos. “É um trabalho constante dos
dois lados. O cliente precisa sentir que faz parte de uma ação exclusiva”, diz
Karen Ehrlich, gerente de marcas da Pernod Ricard.
Segundo
especialistas, para manter o interesse dos consumidores de alta renda, é
preciso colocá-los em situações exclusivas, das quais podem participar só
convidados. É a lógica por trás dos encontros promovidos pela bandeira de
cartão de crédito Mastercard para os que têm a versão
Black, dedicada a clientes de alta renda.
Desde 2011, a empresa realiza seis vezes por ano um show intimista nos
hotéis Fasano do Rio de Janeiro e de São Paulo para 40 convidados. Em julho,
trouxe de Nova York a cantora brasileira Bebel Gilberto. A apresentação
aconteceu durante um jantar, com direito a um bate-papo e a uma sessão de fotos
e autógrafos no final.
Na mesma linha, a marca de luxo francesa Louis Vuitton costuma levar seus clientes brasileiros mais fiéis à semana de moda em
Paris, para assistir ao desfile na primeira fileira, ao lado de artistas como
as atrizes Sarah Jessica Parker e Catherine Deneuve. A carioca Elsaine von
Blanckenhagen já participou de quatro viagens.
Ela embarcou no fim de setembro rumo à capital francesa para assistir ao
último desfile da marca sob o comando do estilista Marc Jacobs. Nessas
ocasiões, Elsaine tem à sua disposição um motorista brasileiro, uma reserva num
hotel próximo da Champs-Élysées, uma das principais avenidas da cidade, e o
acesso a jantares e festas que promovem a coleção recém-lançada — tudo de
graça.
“Não perco um lançamento da marca”, diz Elsaine, cuja bolsa mais cara é
uma edição limitada do modelo Polka Dots, com estampa assinada pela artista
plástica japonesa Yayoi Kusama, que custou 27 000 euros num evento fechado em
Paris.
As experiências são pensadas para reforçar os atributos da marca. É o
que fez a alemã Audi pelo quarto ano consecutivo. A empresa levou em junho 12 brasileiros
identificados como clientes em potencial para uma entrada vip na prova de
resistência automobilística em Le Mans, na França, que dura 24 horas e da qual
participam montadoras como Ferrari e BMW.
“Fiquei as 24 horas da prova acordado”, diz Roberto, de 29 anos, um dos
escolhidos, que preferiu não revelar seu sobrenome. Ele ficou hospedado com
toda a equipe num hotel dentro do autódromo e tinha passe livre para andar
pelos boxes, passear de helicóptero, pilotar karts e conversar com os pilotos —
além de camarotes abastecidos de comida e bebida.
Nos últimos 13 anos, a Audi venceu a
prova de resistência 11 vezes. A ideia é que os clientes associem o resultado
nas pistas à qualidade do veículo. De acordo com a companhia, dos 12 convidados
deste ano, quatro fecharam negócio. Um deles é Ricardo, que pagou 400 000 reais
por um cupê Audi A5. E se tornou mais um exemplo de que os mimos podem valer a
pena.
Fonte: Revista Exame 19/10/2013
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