segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Grupom na mídia - 24 a 28 de fevereiro

A segunda rodada da pesquisa GRUPOM/Tribuna do Planalto avaliou as intenções de voto para o governo do Estado em Aparecida de Goiânia, segundo maior colégio eleitoral de Goiás. 
Acompanhe aqui o que a imprensa tem noticiado a respeito da pesquisa: 
Tribuna do Planalto 
Rádio 730

Diário de Goiás
Mais Goiás
Valle Notícias

Pesquisa GRUPOM/Tribuna do Planalto: Aparecida de Goiânia

Veja a pesquisa completa GRUPOM/ Tribuna do Planalto, que avaliou as intenções de voto para presidente da república e governo do Estado em Aparecida de Goiânia (GO).


Acesse o link: http://pt.slideshare.net/Grupom_/aparecida-jan-20141-31585061


Sucesso ou Fracasso dos Desconhecidos Políticos?

Por Leandro Rodrigues

No ano de 64 a.C. Quinto Cícero escreve a obra Commentariolum Petitionis por ocasião da candidatura de seu irmão, o grande orador romano Marco Túlio Cícero, ao posto de cônsul, cargo mais importante do cenário político de Roma à época. Esta obra, ao ser traduzida para o português, recebeu o título de Como Ganhar uma Eleição (esta obra já foi tema de postagem no blog, veja aqui). A intenção de Quinto Cícero era esboçar um manual com dicas para ajudar o irmão na campanha, e os conselhos nele contidos após mais de dois mil anos permanecem atuais e próximos da realidade eleitoral no Brasil.

Apesar de não falar deste ponto diretamente, alguns dos conselhos dados por Quinto Cícero deixam claro que é importante ser uma pessoa conhecida e reconhecida pelos eleitores; trata-se de elemento basilar de qualquer candidatura. Assim, cabe ao político se fazer conhecer, tratar bem seu eleitor e se manter próximo a ele. Podemos perceber claramente a hodiernidade destas máximas no cenário político brasileiro atual e nos parece claro que, passados dois mil anos, alguns postulantes a cargos públicos ainda têm dificuldade em se tornar nomes conhecidos da maioria do eleitorado.

A um político que pleiteia disputar uma eleição cabe a busca incessante de se fazer conhecido e reconhecido, bem como aumentar seus índices de conhecimento. Alguns sentimentos e avaliações dos eleitores só poderão ser plenamente feitas se estes conhecerem bem o político, como avaliar a experiência, jovialidade ou capacidade de promover a renovação. O desconhecimento pode contribuir para o fator surpresa ou novidade, mas passado o momento inicial faz-se mister aumentar suas taxas de conhecimento.

As pesquisas GRUPOM publicadas pelo jornal Tribuna do Planalto trazem três blocos de possíveis pré-candidatos, tanto para governador quanto para presidente: aqueles que já estão consolidados no cenário político aqueles que já obtiveram algum destaque e aqueles que são nomes recentes, ainda desconhecidos da maioria do eleitorado. Os riscos e dificuldades destes grupos são distintos e complementares. Um político conhecido não precisa dizer quem é, possui credenciais prévias que já contribuíram para formar sua imagem junto ao eleitorado. Se a taxa de conhecimento é elevada, inerente a ela existem alguns riscos, notadamente a questão da imagem. Uma possível imagem negativa ou desgastada dificilmente poderá ser revertida ou atenuada de forma eficaz até 5 de Outubro, data do primeiro turno das eleições de 2014. Tais nomes podem transmitir a imagem de administradores experientes, mas não representam a novidade, renovação, mudança, ou seja, o eleitor pode pelo menos pressupor o que esperar.


Pesquisa GRUPOM Fev/2014 - Registradas junto ao TSE e TRE

Por um lado, os pré-candidatos ainda desconhecidos dos eleitores enfrentarão como maior obstáculo a tarefa de se tornarem nomes verdadeiramente conhecidos até o dia da eleição. Por outro lado, podem inspirar nos eleitores a vontade de algo novo, de mudar, de tentar um caminho diferente e ainda não testado, uma vez que os eleitores já conhecem a forma de administrar dos políticos experientes e conhecidos no ardiloso cenário político. Da mesma forma, os nomes que ocupam uma posição intermediária nas taxas de conhecimento demonstram um equilíbrio entre a experiência e a possibilidade de renovação. Entendemos que isso não necessariamente signifique vantagem em relação aos demais graus e conhecimento, resta àqueles que estão neste grau intermediário de conhecimento expandi-lo sem que se deixe contaminar por desgaste natural da imagem ocasionado pelo tempo e por opiniões já formadas previanamente. Neste sentido, os pré-candidatos a governador em Goiás Antônio Gomide, Júnior do Friboi, Vanderlan Cardoso e, em alguma medida, Ronaldo Caiado poderão tirar proveito destas taxas de desconhecimento ou pouco conhecimento que apresentam. Tornar-se conhecido é uma tarefa hercúlea e penosa. A este esforço há ainda o risco de não se construir uma imagem positiva, pois somente esta irá converter-se em votos na eleição.

Fontes: Pesquisa GRUPOM Fev/2014 - Registradas junto ao TSE e TRE; * Pesquisa Datafolha Nov/2013

O mesmo pode ser dito em relação aos pré-candidatos a presidente: o desafio a ser enfrentado por Eduardo Campos e Aécio Neves para se tornarem conhecidos é enorme e a extensão territorial do Brasil em nada facilita esta missão. Ademais, além do dispêndio financeiro para se tornarem nomes conhecidos enfrentarão as mesmas dificuldades dos candidatos regionais para a construção de uma imagem positiva. Marina Silva ainda não é plenamente conhecida, mas ainda há o que ser feito para expandir sua imagem e tentar manter e fortalecer uma possível imagem positiva junto ao eleitorado. Por fim, Dilma Rousseff é um nome consolidado, e exatamente por isso corre o risco de sofrer algum desgaste em sua imagem. O risco enfrentado pela atual presidente que tenta a reeleição é semelhante àquele enfrentado por Marconi Perillo no cenário político de Goiás: a busca pela reeleição não permitem um discurso de renovação, é preciso apostar no convencimento do eleitorado através da continuidade.

Existem vantagens e desvantagens em taxas de conhecimento altas ou baixas. Aos interessados e envolvidos no jogo político pré-campanha resta compreender o momento político atual, os anseios e interesses do eleitorado. O eleitor busca um nome experiente e consolidado ou busca renovação? As taxas em que o eleitor aponta em quem não votará indicam que o eleitor goiano dá indícios de buscar uma alternativa ainda não experimentada para o cargo de governador. Entretanto, isto não deve ser entendido de forma absoluta e definitiva, ainda há tempo para se tentar melhorar imagens e talvez haja espaço para que atores conhecidos e veteranos no cenário goiano possam voltar com alguma garantia de sucesso eleitoral em 5 de Outubro.

Leandro Rodrigues – leandro.rodrigues@grupom.com.br
Doutor em Ciência Política, pesquisador da UnB e analista de política da Grupom

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

A alternativa do voto nulo

Por Leandro Rodrigues

Um movimento recorrente nas redes sociais recentes trata do voto nulo como alternativa para se protestar contra o sistema vigente e seus atores políticos. A ideia é que se a quantidade de votos nulos for acima de 50% dos votos deverá ocorrer outra eleição e os candidatos não poderão ser repetidos. Apesar destas campanhas de voto nulo, esta prática é incapaz de interferir no resultado eleitoral, pois apenas diminuirá a quantidade de votos válidos e não anulará ou tornará a eleição nula. Tampouco algum candidato poderá ser impedido de participar dos pleitos eleitorais pela quantidade de votos nulos existentes.



Mas esses fatores não deslegitimam o voto branco ou nulo. Trata-se de um importante termômetro da insatisfação da população. O voto nulo pode ser entendido como um voto de protesto, um voto de desinteresse, a saída encontrada pelos eleitores para contornar a obrigatoriedade do voto e não votar no candidato “menos pior”. É uma alternativa que demonstra o desgaste do sistema eleitoral brasileiro e denota a insatisfação do eleitorado mais esclarecido.

O voto nulo pode ser entendido também como outra forma de expressão do desinteresse e apatia do eleitor em relação às Eleições de 2014, tema já tratado em postagem anterior. Remetemo-nos novamente à obrigatoriedade do voto, em que o eleitor se vê compelido a participar, votar, mas não se interessa por nenhum dos candidatos, não vê diferenças. Seu diferencial é se tratar de um exercício e demonstração claros de insatisfação.

Os números da pesquisa GRUPOM/Tribuna do Planalto revelam que os dispostos a votar em branco ou anular o voto são de aproximadamente 6% para governador. Mas ao se considerar apenas os eleitores com curso superior este número chega a 17,2% em alguns cenários. Trata-se de um grupo com maior grau de instrução, possivelmente mais crítico e atento aos acontecimentos políticos, um grupo teoricamente mais sensível e que primeiro percebe possíveis mudanças no cenário político.

Já os números para presidente da pesquisa GRUPOM/Tribuna do Planalto demonstram um cenário distinto. A quantidade daqueles que declararam votar branco ou nulo varia de 3,4% na pergunta estimulada, a 11,3% no cenário 2, números inferiores em relação aos apresentados nas intenções de voto para Governador. Ao restringirmos apenas à faixa daqueles que possuem curso superior os números oscilam de 5,9% a 17,2%.

A intenção de voto para presidente quando é estimulado o nome de Eduardo Campos, sem Marina Silva, demonstra números elevados de votos nulos ou brancos. Entendemos que isso ocorre pelo desconhecimento de Eduardo Campos e a preferência dos evangélicos por Marina Silva, discussão que retomaremos em postagem futura. Isso serve de alerta para os candidatos a governador que quiserem conquistar os votos deste grupo ao definir a participação dos candidatos à presidência nos palanques do Estado.

Vemos que os números de dispostos a anular o voto para governador é expressivo e bem superior àqueles que declaram voto nulo para presidente. A insatisfação com os atuais nomes existe em alguma medida. As alternativas existentes precisam oferecer o que o eleitor realmente busca: mudanças e melhorias palpáveis e próximas ao universo local.


Acesse AQUI a pesquisa completa GRUPOM/ Tribuna do Planalto em Rio Verde - GO.


Leandro Rodrigues – leandro.rodrigues@grupom.com.br
Doutor em Ciência Política, pesquisador da UnB e analista de política da Grupom

Grupom na mídia - 16 a 21 de fevereiro

O jornal Tribuna do Planalto divulgou no último domingo, 16, a primeira pesquisa de uma série em que o veículo e a Grupom estão realizando em municípios estratégicos do Estado. O primeiro estudo, feito na cidade Rio Verde GO, buscou as intenções de voto e a avaliação de políticos para Governador e Presidente.

Veja a repercussão na imprensa nos últimos dias: 

Folha Z



O Hoje 



Diário da Manhã 


Jornal Tribuna do Planalto

Goiás 24 horas


Diário do Interior

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

As eleições do desinteresse

Por Leandro Rodrigues

Daqui alguns anos, ao nos lembrarmos de 2014, provavelmente teremos como fato mais marcante a Copa do Mundo de futebol realizada no Brasil. O resultado é imprevisível, mas independente do vencedor, este será o ano da copa no Brasil. Será aproximadamente um mês de copa que marcará o ano. E os outros 11 meses? A estes resta conviver com a expectativa da realização da copa e a ressaca após seu término, seja celebrando o título ou chorando a derrota.

Para a maioria dos brasileiros, entretanto, por mais que exista a expectativa da realização da copa a vida continua e outros acontecimentos de 2014 não podem esperar, como as Eleições deste ano. Nos bastidores políticos as movimentações, conversas e arranjos seguem aceleradas. Entretanto, o eleitor está distante deste processo pré-eleitoral. Os números da pesquisa GRUPOM/Tribuna do Planalto em Rio Verde demonstram um fenômeno nacional: o pouco envolvimento do eleitorado neste momento. Apesar da imprensa especializada em política noticiar nomes de pré-candidatos no cenário local e nacional, os índices de indecisos ou que não conhecem os pré-candidatos são altos. Em Rio Verde temos aproximadamente 70% de indecisos ou que não conhecem os candidatos para presidente e impressionantes 77% para governador. Isso significa que a cada quatro eleitores em Rio Verde três não decidiram ou não se lembraram, espontaneamente, de um nome a ser votado para governador.



Fonte: Pesquisa GRUPOM/Tribuna do Planalto registrada no TSE BR-00011/2014 e TRE-GO 00009/2014 de 11/02/2014
Ao se estimular alguns possíveis nomes e cenários é natural que o número de eleitores que se dizem indecisos ou não avaliam diminua consideravelmente. Percebemos isso ao vermos que apenas 6,4% não avaliaram ou se declararam indecisos e 6,6% declararam que vão anular seus votos, perfazendo 13% dos entrevistados. Assim, aproximadamente 64% do eleitorado desconhecia ou não se lembrava dos nomes dos possíveis candidatos, quase dois terços dos eleitores.
Um número de não avaliações alto numa pergunta de intenção de voto cuja resposta é espontânea demonstra indícios de desconhecimento dos pré-candidatos, seja pela distância do período eleitoral ou também por desinteresse do eleitorado em relação à política. Este percentual alto de desconhecimento ou indecisão denota uma possível indiferença acerca do processo eleitoral de Outubro.

O desinteresse pelas eleições não é exclusividade de Rio Verde ou do Estado de Goiás. Pesquisa nacional realizada pelo Ibope Inteligência no mês de novembro de 2013 demonstra que 24% dos entrevistados não tem nenhum interesse nas eleições de 2014, enquanto que 32% responderam ter pouco interesse. Isso nos permite inferir que mais da metade do eleitorado tem pouco interesse nas eleições de 2014 e já não se motivam a participar e se envolver na disputa eleitoral.

Os números dos protestos ocorridos a partir de meados de 2013 ilustram esta indiferença ou omissão. Conforme demonstra levantamento do Instituto Análise, 77% dos brasileiros são favoráveis aos protestos, mas a participação é bem inferior a este percentual. Isso nos faz perceber que existe algum tipo de discordância por parte do eleitorado, mas que não será explicitado através da participação de protestos. Há um sentimento de apatia cada vez maior, uma vez que muitos apesar de apoiar os protestos não vão às ruas. Para estes, o voto é seu instrumento, muitas vezes traduzido no voto nulo ou por dispender pouco tempo em seu processo de tomada de decisão e possivelmente manter os atuais nomes que estão no poder.

Em Rio Verde este processo é nítido: o eleitorado demonstra sinais de não perceber diferenças entre os candidatos. Isso serve de alerta para os possíveis candidatos ao Governo de Goiás e que tentam quebrar a bipolarização existente entre PMDB e PSDB. É um sinal claro que o desinteresse cresce, e por mais que novos nomes surjam o eleitorado começa a não acreditar que sejam diferentes, que representem alguma novidade e que não são “mais do mesmo”.

Os sentimentos de apatia, indiferença, omissão em relação ao cenário atual são evidentes. Após o final da Copa do Mundo em meados de julho de 2014 muitos atores políticos acreditam que o envolvimento político irá aumentar. Entretanto, tal análise demonstra-se demasiadamente simplista. Pode até ser que o envolvimento aumente após a copa, mas o desinteresse permanecerá. Cabe aos pré-candidatos encontrar formas para atrair estes dois terços do eleitorado de Rio Verde para a discussão e interesse político. Não há margem para achismos ou amadorismo.

Leandro Rodrigues – leandro.rodrigues@grupom.com.br
Doutor em Ciência Política, pesquisador da UnB e analista de política da Grupom


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Copa do Mundo e protestos

Alberto Carlos Almeida

Diz-se que se faz uma "escolha trágica" quando se tem que escolher entre duas coisas ruins. Qual seria sua escolha se, na Copa do Mundo, houvesse as seguintes duas opções?: ou a organização da Copa é um fracasso ou a seleção brasileira é derrotada pela Argentina na final no Maracanã. É óbvio que não se trata de acontecimentos excludentes, nem são excludentes os opostos desses dois fatos. Contudo, a escolha entre essas duas possibilidades contrasta o que é necessário para que o evento ocorra com o evento em si. Ambos são valores importantes para os brasileiros. A resposta à pergunta mostra qual deles é o mais importante, se vencer a Copa ou organizá-la de maneira primorosa.
Podemos carregar de dramaticidade e de realidade tais possibilidades. O fracasso da organização de uma Copa do Mundo será sempre algo controverso, por exemplo, se a métrica for a Alemanha com seu sistema de transporte que leva aos portões da maioria dos lugares de grande movimento, o que inclui os estádios. Não será necessário, então, aguardar para avaliar o que ocorrerá no Brasil. O que denominei fracasso da organização pode ser caracterizado por engarrafamentos enormes nas cidades onde acontecerão os jogos. Suponhamos que isso ocorra em 15 a 20 partidas (serão 64, no total). Por fracasso, entenda-se atrasos em voos que deixarão torcedores frustrados por não conseguirem ir aos jogos já com os ingressos comprados. Podemos supor que milhares de torcedores de todas as partidas não conseguirão chegar aos estádios por causa disso.


Será também um fracasso se acontecer um acidente aéreo com vítimas fatais por causa do aumento do tráfego de aviões, ou se vários torcedores estrangeiros forem vítimas de latrocínio ao saírem dos estádios. Se tudo isto ocorrer simultaneamente, o que, convenhamos, parece bastante improvável, será a pior organização de Copa de todos os tempos. No fim disso tudo, suponha-se, o Brasil viria a ser campeão pela sexta vez em uma Copa do Mundo derrotando por 3 a zero seu adversário na final.
A dramaticidade é facilmente atribuída a uma final de Copa entre Brasil e Argentina. O primeiro capítulo do drama vem da final de 1950, quando, em nossa casa, o Uruguai nos derrotou. Toda a mídia brasileira e mundial chamaria a atenção para esse fato. Além disso, no jogo final se defrontariam dois craques de primeira grandeza, Neymar e Messi. O jogo seria mais do que dramático. O Brasil poderia vir a fazer o primeiro gol, tal como foi na final de 50 com o Uruguai, e sofrer o empate aos 35 minutos do segundo tempo em uma falha do goleiro Júlio César.
Albert Einstein definiu uma vez a relatividade afirmando que, quando se passa uma hora na presença de uma mulher bonita, parece que se passou um minuto, e quando se passa um minuto sentado em cima de uma chapa quente, parece que se passou uma hora. Os dez minutos restantes da partida seriam os minutos mais longos da vida de todos os brasileiros, quando, no fim, aos 44 minutos do segundo tempo, Messi acabaria por marcar um gol duvidoso, validado pelo juiz, mas que minutos depois as câmeras mostrariam ter sido um gol de mão. A Argentina seria campeã em pleno Maracanã e isso ficaria escrito, para sempre, nos livros de história. Maradona declararia que a mão de Deus jamais abandona a Argentina. Tudo isso teria ocorrido em um Copa que seria avaliada pelos especialistas e pela mídia internacional como um sucesso de organização.
O fracasso da organização da Copa e a derrota para a Argentina, ou qualquer outro adversário, na final são duas coisas que nenhum de nós deseja que ocorra. A questão fundamental é qual desses dois acontecimentos mobiliza mais nossa rejeição. Creio que seja a derrota da seleção na partida final do torneio. O fracasso da organização da Copa é da responsabilidade dos governos. A derrota da seleção é nossa derrota. Sabemos, não é de hoje, que a seleção nos representa mais do que o governo, qualquer que seja. Nossa identidade com a seleção é muito maior do que nossa identidade com os governos e com os políticos. A seleção não faz promessas que não possam ser cumpridas, a seleção não dá a sensação de que estamos sendo enganados ao acreditar nela ou explorados ao acompanhá-la e admirá-la. É assim que pensamos. Acreditamos, ainda que de forma inconsistente, estarmos representados pela genialidade de Neymar, pela raça de Thiago Silva e pelo senso de oportunidade de Fred. Todos nós, brasileiros, em nosso íntimo, cremos que exercemos nossa genialidade quando enfrentamos as enormes dificuldades da vida, temos raça para encarar o chefe mal humorado e senso de oportunidade quando vislumbramos a chance de conquistar a mulher mais cobiçada do pedaço. A seleção está entranhada em nossas vidas.
Apesar disso, há aqueles que vislumbram na Copa do Mundo uma oportunidade de protestar contra as injustiças percebidas hoje no Brasil. O símbolo maior, recentemente mobilizado, em particular por causa da grande importância que o futebol tem em nossas vidas, é o do gasto desnecessário com estádios diante da escassez de recursos para combater as mazelas da saúde pública ou do transporte de má qualidade. A quantidade de problemas a serem resolvidos é imensa, e a simbologia do mundo político, com a pletora de escândalos de corrupção e exemplos de mau uso dos recursos públicos, é a pior possível. O gostar de futebol e o sentir-se representado pela seleção convivem em plena harmonia com o sentimento generalizado de que o sistema político é injusto e os políticos exploram a população. Aliás, trata-se de um sentimento existente não apenas no Brasil, mas em todos os países, inclusive os desenvolvidos. A Copa do Mundo apenas aguçou essa percepção.
Trata-se de uma percepção que entra, com frequência, em aparente contradição com as quatro eleições de continuidade que tivemos: em 1994, votou-se no candidato do governo e pela continuidade do Plano Real; em 1998, manteve-se no governo o presidente Fernando Henrique; o mesmo aconteceu em 2006 com Lula e, em 2010, a maior parte do eleitorado deu continuidade a governos do PT. Somente em 2002 a eleição teve sentido de mudança. Não bastasse isso, também em 2010 os eleitorados dos três maiores Estados brasileiros, São Paulo, Minas e Rio de Janeiro, votaram pela continuidade de seus governos estaduais. Totalizam pouco menos da metade do eleitorado nacional.
Não bastasse isso, há um consenso amplo, entre governo e oposição, de que a política econômica tem que ser mantida, assim como a política social. Ninguém questiona a prioridade que deve ser conferida ao controle da inflação. Quando isso não acontece, o próprio eleitorado dá um jeito de corrigir a rota do governo ao diminuir sua aprovação. As políticas que resultam na redução da desigualdade também não são questionadas. São objeto de consenso as políticas de redistribuição de renda, o aumento real do salário mínimo e a necessidade de gerar empregos. Não há quem afirme que essas medidas e metas não devam ser perseguidas.
Ainda assim, há insatisfação e ela ameaça eclodir sob a forma de protesto durante a Copa do Mundo. O Brasil tem muitos gargalos e seu combate exige tempo, muito tempo. Acredito que a onda de protestos iniciada em meados de 2013 vai perdurar pela próxima década. Haverá picos e vales, mas um segmento importante de nossa sociedade decidiu ir às ruas. Na medida em que as pessoas aumentaram sua escolaridade, passaram a questionar mais o destino dos recursos públicos, passaram a conectar de forma mais clara os impostos elevados com o desperdício, passaram a conectar mais fortemente a ausência de solução de determinados problemas com a inépcia histórica de nossa burocracia. As pessoas foram para as ruas e continuarão indo, para dizer que estão cansadas de uma simbologia que as distancia dos políticos. Protestam para dizer que gostariam que os políticos tivessem uma vida mais frugal. Os manifestantes não sabem, mas têm ido às ruas para protestar pela solução de nossos gargalos.
É impossível afirmar se haverá protestos ou não durante a Copa do Mundo. Muitos previram que haveria durante a Jornada Mundial da Juventude, e acabou não acontecendo. Aqueles que são contra o governo têm previsto que os protestos serão intensos. Os que apoiam o governo dizem que não haverá protestos, ou que serão mínimos. É fato que a população acredita que ocorrerão manifestações e que será uma oportunidade de pressionar os políticos a resolverem de forma mais efetiva os problemas. A população crê que a mídia internacional, na presença dos protestos, dará ampla cobertura e que isso resultará em decisões efetivas dos governos.
A simples crença em um fato não o leva a acontecer. Por outro lado, no caso dos acontecimentos sociais, tal crença pode resultar em uma profecia que se autocumpre. Contra o governo, estão as expectativas da população de que ocorrerão manifestações. Está a favor o clima criado pela mídia em uma Copa do Mundo. Afinal, quem trocará assistir várias vezes ao gol mais bonito, a análise do erro do juiz, comemorar com os amigos a vitória de cada partida da seleção, quem trocará isso por acompanhar as notícias negativas acerca da organização da Copa? Definitivamente, não queremos ser derrotados pela Argentina.
Alberto Carlos Almeida, sociólogo, é diretor do Instituto Análise e autor de "A Cabeça do Brasileiro". alberto.almeida@institutoanalise.com www.twitter.com/albertocalmeida

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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Rolê no mercado

Parceria de shoppings com supermercados estimula a frequência de adultos e famílias

O brasileiro adora fazer compras, mas se engana quem pensa que o shopping center é o local preferido da maioria. De acordo com o relatório Estilo de Vida Regional, da empresa de pesquisa Mintel, hipermercados e supermercados são os serviços mais próximos e mais frequentados pela população, especialmente pelo perfil família. Shopping Centers, restaurantes e bares têm frequência secundária, relacionada a gastos com lazer. Se próximos, cinemas, parques e restaurantes seriam mais frequentados. Os shopping também o seriam, especialmente porque são percebidos como “polos” desses serviços de lazer.

O estudo aponta que centros de compras para o dia a dia (de mantimentos, cuidados pessoais e vestuário) são os locais perto de casa mais frequentados. Essa frequência é mais citada pelos adultos maiores de 25 anos (média 66%) e casados (67%) – público provavelmente responsável pelo gerenciamento e compras do lar -, pelos pais com filhos de três a 12 anos (67%), pelas pessoas das classes ABC1 (66%) e de nível superior completo (70%), que têm mais chances de residir próximo às áreas centrais, mais desenvolvidas e com comércio mais estruturado.

É interessante destacar que a frequência destes lugares é bastante influenciada pelo perfil da população. Em áreas onde há mais presença de adultos jovens e solteiros, shoppings, bares e restaurantes tendem a ter frequência em proporções diferentes. Por exemplo, a citação de frequência de homens entre 16 e 24 anos em shoppings (57%) é mais alta do que em hiper e supermercados (54%), semelhante à citação de frequência em bares e restaurantes (50%).

Especificamente sobre os shoppings, eles são percebidos como próximos e frequentados especialmente pelos adultos jovens (16 a 24 anos). Apesar dos muitos empreendimentos em construção no País terem o objetivo de atender à demanda das classes em ascensão econômica, como C1 e C2 são as pessoas da AB que os frequentam mais atualmente, e isso se deve ao fato de que há mais deles próximos de suas residências.

Hiper e supermercados estão se assemelhando cada vez mais como centros de compra, em relação aos shoppings. Oferecem espaço para refeição, opções para compra de roupas, acessórios e calçados, eletrodomésticos e eletrônicos. Mas, enquanto esses são frequentados por um público mais maduro e por famílias, os shoppings atraem o interesse de adultos jovens da classe média alta, que, a princípio, têm mais tempo e se sentem mais motivados para visitar as lojas e comprar em diferentes lugares (também para pesquisar mais os preços).

Os shoppings, no entanto, ainda precisam estar mais próximos (em termos de localização) de outros perfis de consumidores (como as famílias e a classe média baixa), enquanto os hiper e supermercados já têm essa vantagem. Shoppings do tipo outlet estão sendo percebidos como empreendimentos interessantes para atrair outras classes, mas há oportunidades de se explorar mais parcerias de empreendimentos que abriguem supermercados em um mesmo espaço, bem como abertura de minimercados “express”, dentro deles. Outra tendência nos shoppings é a dos espaços específicos para lazer infantil com monitores, antes vistos apenas em curtas temporadas, como nas férias escolares.

Há oportunidades de se fazer mais parcerias entre shoppings e supermercados na expectativa de unir diferentes perfis de consumo. Já os supermercados e hipermercados têm melhor distribuição e presença regional, a parceria da sua estrutura com shoppings poderia ser uma alternativa à demanda, especialmente alta no Nordeste e Sul.

Cinema

Se mais próximos, os shoppings e cinemas seriam frequentados por mais adultos jovens (43%) e mais adultos entre 25 a 54 anos (uma média de 40%). Há uma alta menção quanto à frequência a cinemas caso as salas de exibição fossem mais próximas de casa, no comparativo com a frequência dos últimos 12 meses, identificada especialmente nas regiões Norte e Nordeste.

Com predomínio de população jovem (de 15 a 34 anos, 36% no Norte e 34% no Nordeste) e os solteiros – quase sete em cada dez (69%) no Norte e 62% no Nordeste, contrastante com os 51% do Sudeste e 50% do Sul -, o cinema vem se destacando como uma importante opção de entretenimento nessas regiões. A ampliação da oferta de salas de exibição vem ocorrendo de maneira significativa: de 2009 a 2012, o Norte teve um acréscimo de 11% e o Nordeste de 8% de salas, segundo dados da Agência Nacional do Cinema (Ancine).

No Brasil, praticamente todos os shoppings possuem um área de cinema conjunta. Isso quer dizer que o número de salas tende a aumentar à medida que aumenta o número de novos centros de compras no País. Mas também poderia se aproveitar, por meio de parcerias, salas de cinema associadas a outros tipos de serviços, como os hiper e supermercados e bancos. Há mais unidades desses, em localidades próximas dos consumidores em geral, o que poderia estimular a frequência de outros públicos específicos, como o adulto maduro e as famílias.

METODOLOGIA
Para a sua série de relatórios do mercado brasileiro, a Mintel fez uma parceria com a Ipsos Observer Brazil para completar 1,5 mil entrevistas ao vivo, que representam as cinco regiões do Brasil, incluindo todos os grupos socioeconômicos e idades de 16 a 55 anos ou mais. A pesquisa representa as dez maiores cidades do Brasil. A Mintel utiliza uma amostra com base em quotas, incluindo amostras de idade, sexo, região, renda e nível de ensino nessas cidades.

Sobre a Mintel
A empresa é fornecedora global de inteligência de mídia, consumidor e produto. Por mais de 40 anos, tem trabalhado na compreensão de tendências-chave, oferecendo dados exclusivos e análises aos seus clientes. Conta com escritórios em Chicago, Nova York, Londres, Sydney, Xangai, Tóquio, São Paulo e também na Índia, Malásia e Cingapura. Mais informações em www.mintel.com.
  



sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Como ganhar uma eleição

Maria Cristina Fernandes

O título é o nome de um livrinho escrito 64 anos antes de Cristo. É de grande utilidade na temporada eleitoral que se inicia. Políticos, marqueteiros e estrategistas de campanha sempre se serviram dele. Por razões inversas, o texto também pode ser de grande serventia para o eleitor.
Sua leitura é especialmente esclarecedora para saudosistas de um tempo que nunca existiu. Os conselhos de Quinto Túlio Cícero mostram que política nunca se escreveu com 'p' maiúsculo. Talvez porque seja feita por gente. Sem conhecê-la, o eleitor se torna presa fácil do discurso de que só os bem-aventurados são capazes de fazer a política maiúscula, aquela da mitologia.
O autor é o irmão mais novo de Marco Túlio Cícero, um advogado de 42 anos com ambição de se tornar cônsul, o mais alto posto da república romana. Descendem de um rico comerciante do sul de Roma que mandou os filhos estudar filosofia e oratória na Grécia.
Cícero enterra a saudade de um tempo que nunca existiu
Marco Túlio torna-se um grande orador nos tribunais mas, para chegar a cônsul, precisa enfrentar as resistências da aristocracia fornecedora de dirigentes da república. Quinto manda seu irmão repetir para si mesmo: "Sou um 'outsider'. Quero ser cônsul. Esta é Roma".
O voto era direto, secreto e masculino, mas o sistema eleitoral conferia mais peso aos nobres. "Nunca deixe que o tomem por um populista", diz Quinto Túlio ao traçar a estratégia de aproximação do irmão com a aristocracia. Deveria ficar claro para os nobres que todo movimento em direção ao povo se devia a tática eleitoral.
Marco Túlio não deveria se deixar intimidar pelos concorrentes de sangue azul. Um tinha tido a propriedade confiscada por dívida e comprara uma escrava para lhe prestar serviços sexuais. Outro matara o cunhado, molestava jovens garotos e corrompia juízes nos tribunais. Essas questões não precisam ser explicitadas mas os adversários devem saber que são conhecidas. Estava lançado aí o primeiro tijolo das fábricas de dossiês.
Esta é a primeira parte da campanha. Em que o candidato se assenhora de sua ambição e se torna amigo dos mais aquinhoados de dinheiro e poder para não ser por eles barrado. Numa disputa eleitoral, diz Quinto, há duas tarefas: assegurar o apoio de seus amigos e ganhar o do público: "Você ganhará o dos amigos com gentilezas, favores, conexões, disponibilidade e charme".
Marco Túlio Cícero deve lhes dizer nunca lhes ter pedido nada antes e que chegara a hora de fazê-lo. "Faça-os saber que se você ganhar a eleição agora você estará em dívida com eles".
O irmão não deve filtrar aliados pelo caráter. Numa campanha, diz o irmão, você não deve ter vergonha de cultivar amigos com gente de quem nenhuma pessoa decente se aproximaria - "Você será um tolo se não o fizer". Nasciam as diretrizes das megacoalizões eleitorais.
A segunda parte da campanha deve tratar de ganhar o povo. O primeiro passo é conhecer as pessoas pelo nome. Num eleitorado de 141 milhões a tarefa é em parte feita pela propaganda na TV. Gente do povo é escolhida a dedo para representar na TV segmentos do eleitorado com quem o candidato deve mostrar intimidade.
Chamar os eleitores pelo nome não basta. Eles precisam saber o que vão ganhar com sua eleição. Por isso, Quinto diz que o irmão não deve ter o pudor de prometer, ainda que mais tarde seja necessário convencer os eleitores de que não foi possível cumprir o prometido.
O mais prudente, diz Quinto, é ser vago em relação às promessas. Dizer aos nobres que manterá seus privilégios, aos empresários que assegurará a estabilidade de seus negócios e ao povo que sempre esteve e estará ao seu lado. "A parte mais importante da campanha é levar esperança às pessoas e atrair seus bons augúrios", diz Quinto. Mas seu irmão deveria saber que não seria capaz de fazê-lo se confiasse facilmente nas pessoas. "A política é cheia de falsidade, deslealdade e traições".
Marco Túlio Cícero elegeu-se cônsul. Durante seu governo, um dos adversários derrotados conspirou para derrotá-lo. Cícero desbaratou a conspiração e persuadiu o Senado a declarar guerra ao adversário. Quinto foi eleito para o mais alto cargo da magistratura, cargo que só perdia para o de cônsul, em poder e prestígio. Depois foi governador na província romana que se tornaria a Turquia. Os irmãos Cícero tinham dominado os códigos para conquistar e exercer o poder na república romana, mas não sobreviveriam à guerra civil que daria início ao Império. No ano 43 A.C. seriam assassinados.

Maria Cristina Fernandes é editora de Política. Escreve às sextas-feiras para o Jornal “Valor Econômico”

Maria Cristina Fernandes é editora de Política e colunista do Valor desde a fundação do jornal em maio de 2000.
Integrou a equipe que fundou a revista "Época", publicação da qual foi repórter especial. Foi editora de Política da "Gazeta Mercantil", subeditora da revista "Veja" e repórter do "Jornal do Comércio".
É formada em jornalismo pela Universidade Católica de Pernambuco e em História pela Universidade Federal de Pernambuco. É mestre em Política Comparada pela Universidade de Paris I e em Política Latino-Americana pela Universidade de Londres.



quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

As lições de Nelson Rodrigues

Por Alberto Carlos Almeida | Para o Valor, de São Paulo

Na abertura da Copa das Confederações, a presidente Dilma foi vaiada. Joseph Blatter, presidente da Fifa, buscando socorrê-la, solicitou à torcida que tivesse "fair play". Obviamente, não foi atendido em seu pedido. Os brasileiros jamais atenderão alguém que se notabilizou por criticar o Brasil, por nos atacar em nossa suposta incapacidade de organizar adequadamente uma Copa do Mundo. A vaia continuou.
Considerando-se esse episódio, é razoável afirmar que é elevada a probabilidade de que Dilma seja novamente vaiada na abertura da Copa do Mundo. Lula foi vaiado no Rio de Janeiro na abertura dos Jogos Pan-Americanos, menos de um ano depois de ter sido reeleito presidente. Aqueles que vão a tais eventos são pessoas de renda mais elevada, pessoas de classe alta que, em sua maioria, rejeitam o PT e seus políticos. Basta ver os mapas de votação que contrastam as áreas ricas e pobres de cada cidade. Se a abertura da Copa do Mundo fosse em um estádio do Nordeste, em Pernambuco, na Bahia ou no Ceará, e se a maioria dos torcedores presentes fossem pessoas de renda baixa, as chances de vaia seriam mínimas. Mas a abertura da Copa será em São Paulo e a renda média de quem estará no estádio é a do 1% mais rico da pirâmide social brasileira.


Não é tudo. Devidamente revisitado e atualizado, Nelson Rodrigues nos ajuda a entender a vaia para além de um fenômeno de aprovação ou reprovação política fundamentada em um perfil de classe social. Ele foi o primeiro que considerou o futebol no Brasil não como um esporte ou como um mero entretenimento, mas como um drama social, representação de quem nós, brasileiros, somos. É por meio do futebol que o brasileiro mostra quem é e, muitas vezes, quem gostaria de ser. Dilma poderá entrar vaiada e sair aplaudida, se encarar o futebol da mesma forma que Nelson Rodrigues o fez. Vamos a ele.
O grande torcedor deste que hoje é o time mais injustamente criticado no Brasil, o Fluminense (aliás, Nelson Rodrigues só podia mesmo ser tricolor), afirmou que o Maracanã nasceu com a vocação da vaia. Nada mais atual, se lembrarmos que Lula foi vaiado no Maracanã. Ali, ou mesmo em qualquer estádio brasileiro, "vaia-se até mesmo um minuto de silêncio". Blatter não sabia disso ao pedir o "fair play" - e assim se explica que seu pedido tenha sido ignorado. Para Nelson Rodrigues, vaia-se até minuto de silêncio porque não há na biografia do brasileiro um único e escasso momento de ternura. O brasileiro é o impotente da admiração. Não sabemos admirar, não gostamos de admirar. Ou, às vezes, só admiramos estando em um terreno baldio e na presença apenas de uma cabra vadia. Somos um povo que berra o insulto e sussurra o elogio. É por isso que a vaia surge quase sem querer, como num automatismo inapelável. Ao saber disso, a presidente Dilma pode reverter a vaia.
Dilma pode ser aplaudida ao final de seu discurso, se considerar, a partir de agora, que cada exibição de nossa seleção será uma aventura pessoal de quase 200 milhões de brasileiros. Se ela entender, como fez Nelson Rodrigues, que não há distância entre nós e a equipe verde-amarela. Há, raramente, uma distância falsa, irreal. Na verdade, estamos encarnados na seleção, quer admitamos isso ou não. Foi justamente por isso que em 1958, 1962, 1970, 1994 e em 2002 deixamos de ser um vira-latas entre os homens e o Brasil um vira-lata entre as nações.
O discurso de Dilma na abertura da Copa tem que ignorar o rosnado dos pessimistas ouvido em esquinas e botecos, que pedem que tenhamos humildade. Para o célebre torcedor do Fluminense, é uma abjeção falar em humildade no Brasil. Diante das riquezas do chamado Primeiro Mundo, somos um povo de paus-de-arara, tal como Lula foi um dia. Cada um de nós é um retirante de Portinari, que lambe sua rapadura ou coça sua sarna. A humildade tem sentido para os césares industriais dos Estados Unidos e da Europa. Nós, paus-de-arara, precisamos, inversamente, de mania de grandeza.
A Fifa e seus representantes nos tratam como paus-de-arara justamente porque não cultivamos a mania de grandeza. Nós mesmos nos criticamos e expomos nossos eventuais defeitos. Todo país tem defeitos, não apenas o Brasil. Mas nem todos expõem seus problemas como que em um campo de nudismo. Os protestos que ocorreram em junho de 2013 foram extremamente prejudicais para os interesses comerciais da Fifa e seus patrocinadores. O motivo é simples: toda a mídia, naquela época, foi ocupada pelas manifestações, e não pela logomarca das empresas, pelos gols espetaculares, entrevistas de jogadores e tudo que tinha a ver com o torneio. Foi uma oportunidade perdida. A Fifa, ao criticar o Brasil, está inadvertidamente fornecendo combustível para que tenhamos novos protestos durante a Copa do Mundo. Está criticando o governo, suas decisões e atuação -, exatamente o que fizeram e fazem os manifestantes.
É bem verdade que a entidade que comanda o futebol mundial mudou bastante o tom nas últimas duas semanas. Contudo, está ainda muito longe de contribuir, com suas declarações públicas, para o sucesso do evento. Criticar publicamente prefeituras, governos e clubes de futebol como a Fifa fez na última semana não ajuda em nada para que os objetivos e prazos de entrega de estádios e infraestrutura sejam cumpridos. Isto aqui é Brasil. Somos contra o conflito, só tolerável em circunstâncias muito específicas e, preferencialmente, em situações que não sejam públicas. A crítica pública ao Brasil, vale repetir, quando feita por uma entidade com a importância da Fifa, pode se tornar combustível para novas manifestações na Copa.
O grande problema em que se incorre ao falar mal da organização da Copa do Mundo no Brasil é que, de acordo com pesquisa do Instituto Análise, 83% dos brasileiros torcem pela seleção, 82% dizem que assistem aos jogos do Brasil durante as Copas, 70% torcem por um time de futebol, 64% se interessam por notícias sobre futebol e 60% conversam ou fazem brincadeiras sobre futebol com parentes e amigos. A proporção dos que respondem afirmativamente a todas essas cinco perguntas é de impressionantes 51%. Ou seja, pouco mais da metade da população brasileira torce pela seleção, assiste seus jogos, têm um time de futebol, se interessam por notícia de futebol e fazem brincadeiras e conversam sobre o tema com parentes e amigos. Para bom entendedor, meia palavra basta: no Brasil, o futebol não é brincadeira.
A comunicação da Fifa ajudaria muito para o sucesso da Copa - que já está garantido, por se tratar de um torneio que ocorre no país do futebol - se dissesse que está impressionada com a criatividade dos brasileiros para resolver suas dificuldades e que essa criatividade está assegurando que tudo fique pronto a tempo do evento. A Fifa pode dizer ainda muitas coisas elogiosas ao Brasil que esteja em consonância com a percepção que temos de nós mesmos. Pode afirmar que, nos últimos anos, o Brasil resolveu com sucesso problemas como a inflação, reduziu a desigualdade, diminuiu o desemprego, adotou políticas sociais de sucesso e que tudo isto mostra que o país é mais do que capaz de fazer uma excelente Copa do Mundo.
A Fifa pode afirmar também que o Brasil é um país de diversidade e tolerante, que não tem uma cultura de conflito e que por isso tem a certeza de que todas as seleções e todos os turistas vão adorar estar no Brasil durante a Copa. Pode enaltecer nossas belezas naturais, nossas cidades históricas, as inúmeras atrações que estarão disponíveis para os visitantes estrangeiros. Não esqueçamos que no meio da Copa do Mundo ocorrerá a festa de São João e os gringos, que apenas ouviram falar do Carnaval, ficarão gratamente surpresos com esta enorme manifestação de energia e vitalidade de nossa sociedade. A Fifa poderia fazer uma mísera menção ao nosso São João. Seria bom para ela, para a Copa e para os patrocinadores. A população adoraria ver a entidade máxima do futebol elogiar uma festa que é dela, população.
Se a Fifa fizer tudo isso, contribuirá enormemente para reduzir as chances de vaia na cerimônia de abertura da Copa. Não ficaríamos muito à vontade em vaiar quem mostra apreço por nós.
Nota: este artigo faz uso prático do texto de Nelson Rodrigues publicado em "O Globo", em 15 de junho de 1966, com o título "O escrete precisa de amor".
Alberto Carlos Almeida, sociólogo, é diretor do Instituto Análise e autor de "A Cabeça do Brasileiro".

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