Por Angela Klinke
As marcas de luxo são aquelas tão desejadas que o
consumidor só precisa ascender para comprá-las, certo? Não mais. Acenar com os
logos e esperar que os clientes venham correndo é uma estratégia com duração
curta mesmo para os mercados emergentes. Em sua 12ª edição, publicada em
outubro, o estudo das tendências do mercado de luxo da consultoria Bain &
Co. em parceria com a Fundação Altagamma é categórico ao afirmar que o
entendimento do consumidor em toda sua complexidade será o "mantra"
do setor na próxima década.
Sonho de noiva - Criado em 1866, o anel de noivadoda Tiffany, de platina e diamante, ainda hoje é um dos itens mais procurados da loja. A partir de R$ 7.000. Tiffany & Co. Brasília: Shopping Iguatemi |
"O setor do luxo deve adotar estratégias do
setor de produtos de consumo em geral que mantém o foco no consumidor, o que
ainda não foi utilizado até agora por esta indústria", diz Cláudia
D'Arpizio, sócia da Bain & Co. e coordenadora do estudo.
O alerta também está na pesquisa sobre os ricos do
mundo feita pela McCann. "As marcas precisam resistir ao desejo de
trabalhar com o conceito tradicional de riqueza e entender que se trata de
pessoas multidimensionais, com paixões originais e que precisam ser entendidas
em camadas", diz o levantamento feito com quatro mil "afluentes"
em 21 cidades do mundo.
La Vie en Rose - Do centro do corpo orgânico do anel partem safiras rosas em um degradê que evidencia uma pérola rara. Por R$ 56.800. Antonio Bernardo. Brasília: Park Shopping |
A indústria do luxo não está imune às questões de
gênero e geracionais, às fragmentações e fusões de estilos de vida, à realidade
omni-channel. Pela primeira vez nos últimos quatro anos, o setor de bens
pessoais de luxo terá um crescimento modesto. Na verdade, um digitozinho de 2%,
indo de € 212 bilhões em 2012 para € 217 bilhões previstos para este ano
segundo dados da Bain & Co.. A região em que o Brasil está inserido, a
América Latina, responde por € 5 bilhões desse resultado.
"Eu
diria que os frutos mais fáceis de colher já foram aproveitados, mas
isso não significa que grandes crescimentos não podem ser atingidos
novamente", diz Cláudia D'Arpizio. Mas para isso, daqui em diante,
"todas as estratégias devem ser construídas a partir do consumidor e não
do mercado". Antes as grifes entendiam que precisavam "educar" os
consumidores. Agora elas devem aceitar ser "educadas" por eles.
Felipe Tendeiro, da Longchamp: 55% só compram quando viajam |
Hora de homenagem - A edição especial da marca de alta relojoaria IWC, “Pequeno Príncipe”, poderá ser encontrada a partir de dezembro na Boutique IWC, em São Paulo. Preço sob consulta. |
Neste
momento isso significa em especial se aprofundar nas particularidades
dos consumidores de nações emergentes, responsáveis por um terço do
consumo de luxo do mundo. Estar preparado para atendê-los em seus países
de origem, tanto quanto no momento em que estão viajando. É claro que a
questão dos preços é determinante para que essa compra seja feita no
exterior. Assim como mudanças no câmbio podem redirecioná-las para casa.
"As flutuações de moedas não podem ser controladas e continuarão a
influenciar esses fluxos. Portanto, as marcas devem focar em alavancas
mais estratégicas, como excelência no varejo, serviço ao consumidor,
'clientelling', e em todas as atividades que possam criar um vínculo
entre consumidores e as lojas locais", diz Cláudia D'Arpizio.
Hora clássica - Releitura de um clássico da Omega, o modelo Bullhead chegará às lojas no Brasil em dezembro, em edição limitada. Por R$ 24.000, nas lojas de São Paulo e Rio de Janeiro |
Pela
primeira vez desde que a Bain começou a medir o mercado, em 2002, o
percentual de crescimento das vendas de luxo nos Estados Unidos (4%)
superou o da China (2,5%). Uma das razões levantadas pela consultoria,
além de uma ligeira recuperação do mercado interno americano, é o
aumento do consumo dos chineses naquele país, em especial em cidades
como Las Vegas e Los Angeles. São eles que também têm sustentado mais da
metade das vendas de luxo na Europa. As críticas ao comportamento dos
chineses, que cospem no chão e não costumam respeitar filas, considerado
mal-educado no Ocidente, contudo, ganham as publicações internacionais.
Barrá-los, educá-los ou cativá-los? Não existe mais zona de conforto
para as grifes de luxo.
Alain dos Santos , da Montblanc: corpo a corpo pra entender o mercado |
Na
avaliação de Roberto Paz, presidente da Gucci para a América Latina, o
mercado tem evoluído radicalmente, com consumidores em estágios
diferentes de apreciação do luxo. "É preciso conquistá-los em uma base
emocional. Eles sabem o que é a oferta, conhecem as marcas, fazem
comparações, estão confiantes sobre si mesmos, de modo que não precisam
mais de um logotipo ou uma marca. Eles querem ser convencidos." No
Brasil, além de atendimento cada vez mais personalizado, por exemplo, a
empresa tem levado seus principais clientes para os desfiles em Milão e
para acompanhar o trabalho de seus artesãos em Florença.
Hora vintage - Com movimento mecânico,
o modelo Panerai Luminor 1950 combina
design vintagee tecnologia na caixa em aço de 47 mm.
Por R$ 27.200 No Brasil pode ser encontrado
|
Quando
chegou por aqui em 2008, a Longchamp imaginava o potencial do país pelo
volume que os brasileiros compravam no exterior. "O país é muito menor
que sua dimensão física. E esse contingente fica ainda menor quando
descobre-se que 55% desses consumidores compram só quando viajam", diz
Filipe Tendeiro, diretor para o Brasil, com base em uma pesquisa de
"cliente oculto" encomendada junto a consultoria Albatroz. Apesar do
potencial de compra local menor que o imaginado, a Longchamp está
ampliando uma de suas três lojas. A primeira unidade da grife francesa
de bolsas e bagagens aberta no Shopping Cidade Jardim em 2008 está
dobrando de tamanho, chegando a 108 metros quadrados.
Tido como o consumidor mais "civilizado"
na comparação com outros emergentes, o brasileiro é bem mais exigente em sua
terra natal do que quando está flanando pelo mundo. "O brasileiro gosta de
se sentir prestigiado e entende que a empresa o valoriza com uma loja com a
grade completa de produtos, por exemplo. Para isso, precisamos de espaço. O
serviço também precisa ser impecável aqui. Lá fora, ele até aceita um
tratamento indiferente porque no fundo está comprando preço", diz
Tendeiro.
Para a divisão de perfumes da LVMH, 70% das compras
dos brasileiros são feitas no exterior. "Este é um resultado muito
importante para as marcas na consolidação global dos números", diz Renato
Rabbat, diretor geral da LVMH Fragrance Brands. Para fortalecer as vendas
internas, além de um grande investimento em mídia, "a multiplicação dos
canais de distribuição e uma forte presença nos e-commerces" ajudam a
alcançar o resultado.
Com mais elasticidade que outros segmentos do luxo,
o de beleza é o que mais incorpora as estratégias do mercado de consumo
convencional e consegue pescar singularidades. "Nosso target inclui o
'connaiseur do luxo', divorciado, que quer o 'Fendi Aqua' por ser de extremo
luxo; uma executiva carioca, de 30 anos, no topo das tendências, com dois
filhos pequenos, que valoriza a simplicidade do 'Flower in the Air' da Kenzo;
até a paulista de 17 anos que escolheu a docilidade do 'Ange ou Demon' para
começar a seduzir", explica Nadia Leute, gerente de marketing da divisão.
Nádia Leute e Rabbat, da LVMH: multiplicação dos canais de distribuição e força no e-commerce |
Aroma mediterrâneo - Notas de bergamota da Calábria e tangerina da Sicília se misturam no perfume L’Aquarossa, da Fendi. Custa R$ 290 no frasco de 50 ml e R$ 335 no de 75 ml. Fendi: (11) 4873.5592 |
Até mesmo para quem está no mercado há 20 anos não
há caminho asfaltado. A missão de Alain dos Santos, diretor geral da Montblanc,
empresa que agora opera diretamente no país, é aumentar o fluxo de consumidores
nas seis lojas da grife e dobrar o faturamento em cinco anos, incluindo aí o
desempenho na rede joalheira que revende a marca. Para isso, ele conta com a
disposição da matriz em equacionar margens e manter os preços só 15% superiores
aos dos EUA. Mas não só.
Santos está adotando a prática do corpo a corpo,
indo a eventos nos pontos de venda para prestigiar os lojistas locais e entender
os consumidores em cada praça. "Temos uma base forte de clientes
tradicionais que nos acompanham nessas duas décadas, mas temos muitos novos
entrando que precisamos conhecer melhor. São jovens executivos que estão vendo
sua remuneração crescer."
Fios de seda - Um dos bestsellers da Janeke,
tradicional marca italiana de acessórios de beleza,
a escova Golden Line é feita com cerdas naturais,
|
Essa abordagem ao novo consumidor precisa ser
cirúrgica. De acordo com um levantamento da consultoria MCF, 30% das vendas de
bens de luxo no país são feitas para compradores que vão às lojas apenas uma
vez por ano. Gastam em torno de R$ 3 mil em muitas prestações.
A empresária Natalie Klein, sócia-fundadora da
NKStore, acredita que guiar os negócios pelo drive do consumidor significa
amadurecer com ele. Suas clientes fizeram escolhas bem mais racionais este ano,
optando por peças mais duradouras e atemporais. "A cada coleção tenho de
saber exatamente o quê selecionar para minha seção de importados, estar em
sintonia com o que minha consumidora deseja naquele momento", diz. O
resultado é que mesmo grifes que abriram suas lojas próprias no país como a
Lanvin, por exemplo, continuam vendendo na NKStore.
Elegância discreta - Da coleção de outono da Prada,
a
Saffiano Cuir Old tem couro com tratamento
especial que reforça a cor. O
icônico triângulo da marca
está posicionado discretamente no interior da pasta.
Por R$ 6.400. Prada, Shopping Iguatemi, Brasilia.
|
As grifes internacionais de luxo respondem por 20%
do negócio. As marcas próprias são a sustentação da NK e para mantê-las
vigorosas Natalie investe em uma aproximação constante com as consumidoras,
promovendo eventos culturais e até a customização de produtos. O
aperfeiçoamento de sua equipe de atendimento é outro segredo. "Elas são
estimuladas a frequentar feiras e galerias de arte para aprimorar o
olhar."
Tanto Tendeiro, quanto Santos e Natalie entendem
que a fase de deslumbramento com o luxo no país está passando. Agora é o
momento da consolidação e isso passa por uma abordagem de maior aproximação com
o cliente. "Cada vez mais você tem de criar pontos de contato com o
consumidor e no nosso mercado isso precisa ser feito no nível do detalhe",
diz Luciano Rodembusch, vice-presidente da Tiffany para América Latina e
Caribe.
É fundamental hoje criar laços com a cidade em que
se começa um trabalho, defende Rodembusch. A empresa estudou o mercado
curitibano antes de abrir uma joalheria no shopping Pátio Batel. Como Curitiba
tem uma "forte relação com a ecologia", o papel de parede
especialmente criado para a loja tem uma inspiração na natureza. "Como o
shopping fica próximo da antiga rua das Magnólias, o carpete faz uma referência
às flores", conta. Para a inauguração, foi colocada na vitrine uma coleção
de tanzanitas, porque as gemas ganhariam muito efeito com a incidência de luz
natural do lugar. "Essa foi nossa melhor abertura de loja. Estamos indo
muito bem em Curitiba", diz ele.
Além disso, em todos os mercados em que a Tiffany
está presente, o consumidor é convidado a avaliar cada compra. "Eu
monitoro pessoalmente e-mails com críticas e sugestões das 16 lojas que temos
na América Latina", conta Rodembusch.
Repaginação - Lançadas nos anos 1950, época de pós-guerra e escassez de materiais, as bolsas com alças de bambu viraram ícones da Gucci. Por isso, ganharam novas versões em 2013. Por R$ 6.300. Gucci: (11) 3097.8655 |
A lojinha, inspirada numa lanchonete retrô,
funcionava como um "bar de seda" onde eram
vendidos lenços e gravatas da grife numa proposta bem mais descontraída. Na mesma época, a empresa lançou um aplicativo que ensinava diversas amarrações das peças. Com isso, a Hermès conectou-se com o público jovem, aproximou-se de quem nunca pisou em suas lojas e ainda permitiu que o consumidor que estava longe da grife por causa da crise encontrasse o caminho de volta.
funcionava como um "bar de seda" onde eram
vendidos lenços e gravatas da grife numa proposta bem mais descontraída. Na mesma época, a empresa lançou um aplicativo que ensinava diversas amarrações das peças. Com isso, a Hermès conectou-se com o público jovem, aproximou-se de quem nunca pisou em suas lojas e ainda permitiu que o consumidor que estava longe da grife por causa da crise encontrasse o caminho de volta.
Leia mais em:
Fonte: http://www.valor.com.br/empresas/3352780/revisao-de-estrategia
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