Quem ficou espantado com a aquisição pela Amazon da WholeFoods, rede de supermercado de orgânicos, pode se preparar. Provavelmente ainda neste ano, o gigante do e-commerce começará vender muito mais do que livros no Brasil. Isso significa a experiência de compra, rapidez, facilidade e segurança que já conhecemos transposta para outras categorias de produto.
Para os consumidores será uma festa. Para os varejistas, soou o alarme de uma tsunami. Basta dar uma espiada lá fora. Alguns importantes templos de consumo americanos estão em crise. Fechamento de lojas e milhares de demissões estão previstas ou em curso pela Macy´s, Sears e JC Penney. É o “efeito Amazon” em ação. Ou a tal da “transformação digital”.
Está cada vez mais evidente que o varejo convencional está entrando em colapso — e os problemas são tão claros quanto as vitrines. Como foi a sua última visita a uma grande loja? Provavelmente os vendedores não estavam tão dispostos e simpáticos, faltavam produtos ou justamente o seu tamanho, informações como preço e características eram inadequadas, faltava criatividade na ambientação e a passagem pelo caixa demorou mais do que você gostaria, apesar da fila pequena. Fila? Sim, diante de pessoas habituadas a comprar em poucos cliques, no sofá, ainda somos submetidos a essa formação arcaica. As vantagens — e encantos — da loja física empalideceram ao longo dos últimos anos. Parte por culpa de uma experiência de compra que, contrapondo o que chamam de diferencial do varejo físico, muitas vezes é bem mais agradável no mundo digital.
Isso porque bem informado, high tech e empoderado, o novo consumidor busca conveniência máxima e experiências interessantes. Startup no espírito até hoje, a Amazon é altamente sensível ao público, como se fosse o familiar mercado da esquina. Apoiada em uma poderosa análise de dados e em Inteligência Artificial, propõe soluções e produtos pertinentes, que fazem sentido para o consumidor. A oferta de itens é imensa, a entrega, rápida, o processo de compra, incrivelmente simples. Logo terá robôs que conversam, auxiliando na jornada de consumo. Não é à toa que ela já responde por 50% do comércio eletrônico no mercado americano.
A aquisição da WholeFoods (WF) assinala a capacidade da Amazon de desenhar o futuro. Para quem não prestou muita atenção, de imediato ela passa a: 1) deter um território quase inexplorado do ponto de vista digital, o de alimentos frescos, reforçando seu desejo de se tornar one stop shop, onde se compra de tudo; 2) dominar um segmento em ascensão, o de orgânicos, ancorado na crescente preocupação das pessoas com a saúde e que, sem dúvida alguma, irão explorá-lo à medida que tenham maior comodidade para adquiri-los; 3) integrar as bases de clientes e consumo das duas marcas, potencializando a já provada competência da Amazon na exploração de dados; 4) contar com 450 lojas físicas em importantes centros, incrementando sua rede e capacidade de distribuição e ganhando a competência para a complexa entrega de fresh grocery, já dominada pela WF. Além disso, a WF poderá absorver inovações como o Amazon Go, supermercado onde não há caixas nem filas, e tantas outras que a capacidade de inovação e investimento da Amazon pode realizar.
Em sentido oposto, o Walmart adquiriu o principal e-commerce americano de moda masculina, o Bonobos. É uma tentativa de ataque ou de deter o avanço da companhia de Jeff Bezos. Cerca de 20% das roupas nos Estados Unidos já são comercializadas pela internet, vencendo a teoria de que provadores seriam à prova do digital. O desafio, porém, é maior: desenvolver a força inovadora de um concorrente que já nasceu digital, enquanto o Walmart traz no DNA o pensamento e a pesada estrutura do varejo tradicional.
No Brasil, o e-commerce tem números positivos e negativos – cresceu nos últimos anos, há a promessa de bom desempenho em 2017, mas os resultados continuam a desejar, no geral. Resta saber como enfrentaremos o “fator Amazon”, que mais do que uma companhia, representa um grupo de empresas digitais que continuam rompendo modelos e setores da economia tradicional.
Por Alessandro Cosin, diretor-executivo da Cosin Consulting LinkedbyIsobar para O Globo
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